Sunday, May 13, 2007

As palmadinhas cómodas de quem define os nossos problemas!

Justiça moçambicana está no bom caminho - considera juiz federal dos Estados Unidos da América.
O JUIZ federal dos Estados Unidos da América Peter Messite considera que, apesar das severas críticas de que tem sido alvo, o sistema judicial moçambicano está no bom caminho. Segundo Messite, que trabalhou nas principais cidades do país, nomeadamente Maputo, Beira e Nampula, há coisas boas que tais críticas apagam, não as deixando transparecer na opinião pública.
Maputo, Sábado, 12 de Maio de 2007:: Notícias
Falando ontem, em Maputo, numa conferência que marcou o final da visita que vinha efectuando ao país desde segunda-feira, Peter Messite disse ser importante que o país acelere a reforma do sistema judicial e tome medidas que garantam a facilitação do acesso à justiça à maioria da população. O juiz considera que a jovem democracia moçambicana já deu passos significativos, destacando a reforma do sistema judicial em curso e a existência de pessoas honestas que acreditam no seu trabalho. “Podemos dizer, sem reservas, que Moçambique está no bom caminho”, vincou. O sistema judicial moçambicano, segundo reconheceu, tem sido confrontado com críticas muito duras, acusando-o de ser muito lento, bastante oneroso, enfermo de corrupção e de prestar maus serviços. “Há dúvidas e desconfianças, enfim, muita crítica que não oferece soluções, mas, por outro lado, há pessoas de boa-fé interessadas em avançar e Moçambique não é excepção. O maior desafio é integrar todas as iniciativas num sistema judicial único”, disse. Para sustentar a sua posição, Peter Messite apontou como passos em curso a própria reforma do sistema judicial, a descentralização da administração da justiça, entre outros. Frisou jogar papel de capital importância o cometimento do Presidente da República, Armando Guebuza, no combate sem tréguas à corrupção, o que demonstra claramente a vontade de fazer avançar a tão jovem democracia moçambicana. “O importante ainda é abrir as portas para que o acesso à justiça não pregue susto a ninguém, simplificando no máximo o sistema, e avançar com um programa de formação virado para as comunidades, para que estas conheçam a importância da justiça num país democrático”, referiu. Para isso, a fonte defende a realização de seminários para a promoção das relações entre a justiça e os “media”, onde os juízes e jornalistas poderão discutir os assuntos relacionados com a justiça para que as comunidades tenham uma informação real. “O povo tem que ter confiança no sistema. Para isso, é importante garantir-lhe assistência jurídica, reduzindo os custos”, afirmou. AIM.
Que eu me recorde nunca um dirigente Moçambicano foi aos EUA dizer como anda a democracia na terra do tio SAM. Provavelmente porque se assume que do lado de lá tudo vai, e sempre, bem! Afinal, eles são os guardiães mundiais do poder do povo. É com essa petulância que se autorizam a emitir juízos de valor sobre o estágio de maturidade dos aprendizes nas lides democráticas e de administração da justiça. É assim que vejo as declarações do Juiz federal Americano que recentemente esteve de visita ao nosso pais. Veio, acima de tudo, dar umas palmadinhas nas costas pelo que considera de “bom caminho” em que se encontra a nossa “jovem democracia”.
Com que base de conhecimento o Juiz federal americano se autoriza a emitir tais juízos sobre o estágio, não só, da nossa “jovem democracia”, assim como do sistema judicial, questiono-me. Fazendo fé ao reportado pela AIM, o Juiz tem alguma, mas pouca informação sobre a nossa justiça. Provavelmente, por essa razão, seu discurso é repleto de juízos de valor e menos e de juízos de facto.Pouco do que é e mais do que deve ser feito. É um discurso politicamente correcto e a alinhar com o que frequentemente ouvimos do governo e dos informes apresentados pelo PGR à assembleia da república, “apesar de tudo, das dificuldades... o balanço é positivo”. E como palavra de Americano, cá entre nós, é como palavra de Deus, quem mais terá autoridade para dizer que as coisas não vão tão bem como se vaticina. É por causa deste tipo de discursos, de pessoas não autorizadas, pelo menos pelo conhecimento de facto, que governantes, a primeira-ministra, dizem que nós próprios não sabemos reconhecer e valorizar o que entre nós há de bom. Ficamos a espera da aprovação estrangeira, diz a Ministra. Prefere a aprovação americana, pelos vistos. Palmadinhas nas costas. Vindas de alguém que releva, pelo seu discurso, não saber nada além do que lhe foi dito nas arejadas salas VIPs das instancias de hotelaria e turismo desta pérola do Índico como marketingcamente lhe chamam alguns.
São essas mesmas pessoas que das salas arejadas definem os problema para e por nós, e se dão ao luxo de oferecerem as soluções atribuindo-as a nós como seus mentores.

Quem define os nossos problemas?
A reforma do sistema judicial é em si um indicador de que se está no bom caminho? É por ter sido declarada pelo Juiz federal, que assim o devemos considerar? O que faz da reforma a solução para os problemas do sistema judicial? Por exemplo, em que medida a reforma representa uma solução adequada para a exclusão de uma boa parte dos Moçambicanos ao sistema judicial formal. Como a reforma lida com a situação de um país onde o povo não conhece o discurso tecnocrata dos tribunais? Como se reforma algo que ainda não ganhou forma, algo que está em construção? Como o próprio Juiz federal refere a dado passo ainda existem muitos Moçambicanos que não tem a acesso a este sistema formal de justiça. Há Moçambicanos, e não são poucos, que nunca pensam num tribunal formal como meio de resolução de conflitos. No entanto, alguém define o problema do sistema de justiça como sendo a reforma.
O Juiz federal reconhece que este mesmo sistema enferma de problemas de credibilidade. “Há dúvidas e desconfianças”, refere, mas as minimiza o problema. Afinal, restam alguns "honestos" e que “acreditam no seu trabalho”, entre os quais o presidente da república. Essas pessoas se encarregaram de purificar o sistema através da luta cerrada contra a corrupção. Alias a reforma ao que tudo indica tem como fim, encetar a catarse purificadora, para produzir mais “gente honesta”, de “boa –fé”, e "não corruptível". É por isso mesmo que o Juiz conforta estas pessoas “honestas” e “trabalhadoras” sugerindo que não se preocupem com as “criticas que não oferecem solução”.
O maior desafio anuncia o Juiz federal é integrar todas as iniciativas num sistema único. O que significa, porem, integrar as iniciativas num sistema judicial único? Significaria, por exemplo, acabar como as formas, alternativas, consuetudinárias de administração da justiça? Esta explicita a sugestão de que se deve alargar o acesso das “cidadãos” à um sistema simplificado de justiça. O que é um sistema simplificado de justiça? Pelo que percebo existe um claro exercicio de definição dos nossos problemas pelo Juiz. O juiz não veio à Moçambique colher experiência de como a gente lida com os problemas do nosso sistema de justiça ainda em construção. Não, veio dizer quais são os problemas, que soluções devemos adoptar, com que tipo de pessoas. Existe diferença significante entre vir colher experiência e vir dizer nos como por aqui andam as coisas.
O alerta há muito tem sido feito, pelos cientistas sociais, esses que não sabem fazer. A verdadeira soberania de um povo é aquela que o permite definir os seus próprios problemas, assim como as prioridades na sua solução. O desafio então é o de recuperarmos o direito de definir os nossos problemas! Queria ouvir um dia essa avaliação, de que estamos no bom caminho, ser feita pelo pacato cidadão. Ai a coisa teria outro sentido.

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