Thursday, February 21, 2008

Em defesa da razão: contra as teorias todo o terreno (4x4)!

O Jurista Custódio Duma escreveu um texto que é um atentado a razão! É um atentado a razão porque não observa os critérios mínimos da apresentação de um argumento coerente. As conclusões que tira sustentam-se na base de um conjunto de falácias argumentativas caracterizadas por: insinuações, apelo as emoções, princípio de não contrádição (uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo), entre outras. Nesta postagem vou apenas dar um exemplo sobre causalidade. Não sei se continuarei com este excercício para todo o texto de Duma, pois cada frase nova introduz argumentos cada vez mais problemáticos, pelo que continuar a analisar séria o mesmo que insistir em alvejar uma presa ferida!

A Relação de causalidade.

1) "A revolta popular do dia 5 de Fevereiro, teve como causa o elevadíssimo custo de vida e a ausência de serviços públicos para satisfazer as necessidades básicas dos cidadãos” (Custódio Duma).

A frase acima expressa a conclusão mais categórica do texto de Duma. Nela Duma estabelece uma relação de causalidade entre dois fenómenos: a “revolta popular” de 5 de Fevereiro [x]e a ausência de serviços públicos para satisfazer a necessidade dos cidadãos [y]. Uma relação de causalidade pode ser entendida como o conjunto de todas as relações de causa-e-efeito. Ainda não fui claro. Um exemplo: Imaginem que estamos numa sala de onde nossa vista consegue alcançar a única porta de saida. Estamos sentados e temos um gato por perto. Derepente vemos uma bola rolar atravessando a porta. A nossa primeira reacção, instantânea, é olhar para o lado oposto da direcção que a bola toma. O gato, por seu turno, não faz nada disso, põem-se a correr, saltitando, atrás da bola. Bom, o que informa a nossa acção de olhar para trás e tentar perceber o que faz aquela bola rolar naquele sentido (trajectória) é o principio de causalidade que opera em nossa cabeça. O principio da causalidade é uma propriedade da razão (O filósofo Emmanuel Kant considerava-a uma categoria aprioristica tal como o tempo e o espaço). Sabemos que para uma bola rolar em determinada direcção é porque alguma força lhe foi aplicada e actua no sentido contrário da direcção que a bola toma. O gato, por ser irracional, não partilha do mesmo principio.
As causas por detras do rolamento da bola podiam ter sido várias: alguém podia ter chutado a bola, podia ter sido a força do vento a empurar a bola, enfim N possibilidades. Imagino que todos conheçam a lei da queda livre dos corpos. A queda da maçã era muitas vezes evocada pelos professores de física para nos meterem na cabeça essa lei de Newton. Se uma maça cai, diziam, a causa de sua queda reside na força de gravidade da terra que actua sobre todos os corpos suspensos. Penso que um jurista da craveira de Duma devia estar a par deste principio básico que afinal é crucial para sua própria profissão. Diz-se, em direito, que a causalidade é a relação factual entre ( x) e o resultado (y). Chama-se a essa relação de nexo causal. O que faz Duma fazer vista grossa a esse princípio quando analisa a sua sociedade?
Existem vários tipos de causalidade ou de relações de causalidade. Não vou poder abordar todos, por economia de tempo. Vou referir-me apenas a dois tipos gerais e três subtipos. Quando um efeito resulta de uma única causa estamos perante uma relação de unicausalidade. Quando, por sua vez, o efeito resulta de várias causas estamos perante uma situação de multi ou pluricausalidade. Há fenómenos que pela sua complexidade não nos permitem de imediato estabelecer um nexo directo e unicausal. Nesses casos recorre-se a construção de modelos causais. O primeiro passo para a construção de um modelo causal é o levantamento de todos elementos e componentes que achamos relevantes para a ocorrência do fenómeno. No caso das manifestações poderiamos proceder dessa meneira. Esse exercício permitir-nos –ia distinguir :

a) “causa necessária– factor mínimo fundamental para a ocorrência da “revolta popular”!
b) causa suficiente – factor que, quando presente, garante a ocorrência da “revolta popular”.
c) “causas componentes - factores, supostamente, de menor importância que, quando associados, podem tornar-se em causa suficiente para “revoltas populares”. Como habitual, o sociólogo Elísio Macamo escreveu um excelente texto elucidativo sobre o tipo de relação causal que podemos encontrar ou não entre as manifestações do dia 5 de Fevereiro e uma série de váriáveis ( fenómemos). Quem lê esse texto a partida descarta a conclusão apressada de Duma que coloquei logo no inicio desta postagem. Leiam o excerto alargado do texto de E.M mas abaixo, ou todo o texto aqui.
Excerto alargado!
(...)"Porque é que houve manifestações no dia 5 de Fevereiro? Podemos entender esta questão também como um convite para explicarmos esta ocorrência singular no contexto geral da nossa esfera pública. Porque é que ao invés de as pessoas irem trabalhar normalmente como o fazem todos os dias, algumas delas foram à rua fazer o tipo de coisas que fizeram? Aqui seremos obrigados a fazer deduções que nos apontam para vários caminhos. O que está em questão nesta pergunta já não é a identificação de características que associamos à noção de “manifestação”, mas sim a própria ocorrência. Assim, podíamos simplesmente descrever o contexto dentro do qual a manifestação ocorreu (ou teve mesmo que ocorrer). A pergunta é: que condições foram necessárias para que a ocorrência tivesse lugar? O aumento do preço do “chapa” foi uma condição importante, mas a pergunta – uma pergunta que é raramente colocada – é de saber em que medida. Aqui as coisas complicam-se e os que gostam de fórmulas simples continuam a ler a seu próprio risco. Talvez seja oportuno introduzir uma distinção muito importante entre condições necessárias e condições suficientes para que algo ocorra. Uma condição é suficiente quando ela é catalizadora imediata de um determinado evento. Por exemplo, se alguém é baleado mortalmente podemos dizer que a causa (a condição suficiente) da sua morte foi o projéctil que se hospedou nos seus pulmões. Uma condição necessária é um pouco mais complicada, pois envolve tudo quanto deve ocorrer para que a condição suficiente tenha o efeito que imputamos. Assim, no caso da pessoa baleada mortalmente há uma série de condições necessárias, nomeadamente que alguém tenha disparado, que a arma não fosse nenhum brinquedo, que o alvejado não tivesse colete anti-balas, etc. Estas considerações levantam questões em volta do que significa dizer que as manifestações foram causadas pelo aumento do preço do chapa. Em que medida? Qual é a relação exacta entre o aumento do chapa e a manifestação? Aí alguns socorrem-se legitimamente das condições necessárias que incluem a indiferença do governo, a precariedade geral da vida nos centros urbanos do país, o desespero dos jovens e uma série de outros factores que aduzimos para proporcionar contexto para a ocorrência. Reparem que não estou a levantar a bicuda questão de saber como se faz este salto explicativo de certas ocorrências como sendo a causa de uma outra. Porque é que o aumento da tarifa do chapa, por exemplo, leva as pessoas a manifestarem-se? E a manifestarem-se contra o governo? Porque não o fazem contra os chapas eles próprios? E porque a manifestação é naqueles moldes? Porque é que as pessoas não marcharam para o parlamento e baixaram as calças? E saias, já agora? Estas perguntas todas convidam-nos a aduzir mais ocorrências que vamos integrando numa cadeia causal que, no fundo, não estabelece nenhuma relação directa entre o que julgamos ser a causa e o efeito”. (fim do extracto:retirado do http://www.ideiascriticas.blogspot.com/).
Como podeis ver as conclusões de Duma, além de precipitadas, representam um atentado a razão. Se achar conveniente poderei voltar as muitas passagens e exemplos de argumentos falaciósos que abundam o texto de Duma.

Para terminar deixo-os com algumas frases para que cada um faça a sua análise.

2) “A imagem que nos é mostrada é de um povo que para além de ser explorado é punido com a falta do básico que necessita para sobreviver”. (C.Duma)

O que é ser explorado? Quem é o explorador? O que é punir? O explorador fâ-lo para punir? A punição define a exploração ou vice-versa? Porque razão? Que interesse têm o explorar em punir o povo? O que ganha com isso? Como podeis ver está frase faz apelo as emoções. Usa termos de maneira bastante irresponsável e inflamatória sem os clarificar. O que é que Duma considera como básico, por exemplo? O básico para ele é igual ao básico para um governante, por exemplo, e já agora, ou para um "deserdado"?
3) “Enquanto isso, os criminosos andam à solta e saqueiam o pouco que as pessoas têm sob o olhar tímido das autoridades”. (C.D)

4) “As próprias autoridades, sempre que podem, dedicam-se a saquear o cidadão, principalmente os que se encontram nas estradas, como fiscais e polícias”.(C.D).

A teoria 4x4 de que falo é aquela em que todos os problemas descritos por Duma resultam da apatia do Estado e do Governo. Resulta de uma di-visão simplista da realidade entre governo explorador e governados (povo) sofredor, martirizado, explorado! Uma teoria da falta de vontade do Estado e do Governo de resolver os problemas do povo. E porque é que essas coisas são assim? Ninguém explica! Não vale dizer que é porque o Estado é explorador, corrupto e pronto, isso faz parte do problema descrito e a ser explicado. Porque é que o nosso Estado (governo) é explorador, corrupto etc? É uma caracteristica essencial deste? Como podem ver não sairiamos desta cadeia circular de uma téoria de conspiração que nada explica, só insinua com generalizações absurdas e uso discuidado de terminologia rebuscada. É a isto que não me canso de chamar de senso comum erudito. Com uma critica - absolutamente pobre - como está não há governo que se incomodaria no mundo!

11 comments:

Elísio Macamo said...

acho que aquele texto podia ser melhorado com pequenos toques. por exemplo, no primeiro parágrafo ele apresenta uma tese muito forte, a saber que as manifestações e os linchamentos são o resultado da ausência do estado. no terceiro parágrafo ele continua e diz que em maputo, matola e beira aqueles fenómenos são resultado da má qualidade dos serviços do estado. antes de promover um texto que começa de forma tão problemática como este (e, ao que parece, o custódio duma enviou o texto ao carlos serra antes de o publicar) podia-se dizer ao autor para explicar esta aparente contradição entre ausência e má qualidade. por exemplo, ele podia argumentar no texto que má qualidade é o mesmo que ausência. mas ao fazer isso, podia se quedar por alguns instantes a tentar perceber porque os serviços são de má qualidade, o que o "povo" pode fazer para exigir a sua melhoria, enfim, o que se pode fazer para acabar com a aparente indiferença do estado. as pessoas que prestam esses serviços do estado nesses lugares são representantes do estado, mas ao mesmo tempo, são pessoas como nós. são as mesmas que se queixam de outros maus serviços. e indo por aqui, trabalhando seriamente na coerência do argumento produziria um texto ainda mais útil para o debate público. não precisa de deixar de responsabilizar o governo pelo que anda mal, mas precisa de um argumento coerente que não fere a nossa razão. deixando o texto assim como o publicou recusa alternativas ao próprio povo que quer defender ao supor, como a pessoa que o promove, que a única maneira de corrigir as coisas no país é abandonar o diálogo e a moral e passar para a violência. as manifestações violentas e os linchamentos são evidentes indicadores de um grande mal-estar na sociedade e para efeitos imediatos de agitação política podemos com toda a plausibilidade que os maus hábitos de reflexão de alguns de nós nos incutem dizer que tudo isso é culpa do governo. para efeitos de compreensão da problemática, porém, ganhamos pouco. cada vez mais penso que estas discussões que vamos tendo revelam apenas que estamos em registos diferentes. acho que uns estão mesmo a fazer política e pensam que todo aquele que acredita na possibilidade de reflectir seria e honestamente um problema também só está a fazer política.

Anonymous said...

Caro Patricio,

Acho que é problemático de extrair uma frase (ou excerto) dum contexto total de 1.150 palavras. Sempre admirei a diversidade da blogosfera moçambicano. Qual é o motivo para fazer correr tanta tinta para desqualificar o Custódio Duma? Para uma analise tão demolidor sobre um texto dele? Alargar o horizonte intelectual dos leitores? Sem respeito, sem tolerância? Esperas que cada um se deve aproximar a tua maneira de pensar ou escrever? A mesma musica, a mesma ópera para todos? Acho que a tolerância é um valor que, infelizmente, esta cada vez mais fora de moda aqui. Digo isso porque cada um tem direito a um ponto de vista diferente sobre as causas da revolta popular do dia 5 de Fevereiro. Para mim é uma perda total de tempo sempre alimentar animosidades e preconceitos entre os blogistas moçambicanos.

Um abraço
Oxalá

Patricio Langa said...

Estimado Oxalá!

Obrigado pelo seu comentário.

O frase que extraí do texto de Duma é, no meu entender, uma das que sintetisa o seu argumento. É um argumento forte, no sentido de que tira uma conclusão categórica sobre as “causas” do 5 de Fevereiro. Não contei o número de palavras da frase. Nem interessava fazer isso, por não se tratava de buscar qualquer tipo de representatividade. O que me chamou atenção naquela frase é a relação de causalidade – simplista- que ele estabelece. O meu texto tenta mostrar isso desenvolvendo a noção e os contextos de aplicação do principio de causalidade. Desqualificar?Como é que se chama a um texto mediocre, em termos de argumentação, se não mediocre? Eu não estou e nunca tive razões para desuqlificar Custódio Duma. Estou a qualificar o seu texto em termos argumentativos de mediocre. Existe diferença nisso. Todos temos direito a opinião! Sim. Estou completamente de acordo consigo. Todavia, a a partir da altura que essa opinião é expressa em espaço público – reclamando um certo estatudo na descrição da realidade – já não mais pertence ao seu autor. É publica. E como tal deve ser escrutinada no seu mérito. Deve ser análisada. Não vejo porque é que o meu texto falta respeito ao Custódio Duma. Pelo contrário, o facto de eu ter deixado de fazer outras coisas importantes (para mim) e dedicar-me a analisar o texto, no meu entender, mostra o valor que eu dou a sua intervenção. As coisas que não ( me) interessam, simplesmente não comento. Não. Não espero que ninguem se aproxima a minha maneira de escrever. Não sei de que fala quando diz que a tolerância é um valor que escasseia por aqui. De que tolerância fala? Em relação a quem? Realmente, não tenho interesse em alimentar animosidade alguma muito menos preconceitos entre bloguistas.
PS: no final do texto citei mais algumas frases problemáticas de Duma. Deve deve roubar mais algumas palavras as 1.150.

Jaime Langa said...

Meu irmão Patrício Langa, Não faz isso. O Duma é Jurista, Eu sou Gestor, O Gabriel é economista, o António é engenheiro... e você é sociólogo. Não obrigue a todos a exporem as suas opiniões “para debate” recorrendo-se a técnicas básicas de uso e interpretação das palavras, como você o faz sendo sua especialidade. Ignore os “erros” técnicos e procure encontrar o conteúdo ou a orientação da sua opinião sobre os factos e faça comentário sobre isso. Dizes que não estás a desqualificar o Duma, mas sim, o seu texto...isso é diferente só na tua especialidade porque na minha é igual, aliás na matemática também é igual é alteração da posição dos factores de uma multiplicação o produto (o resultado) não altera. O teu texto “comentário” é muito interessante, A tua análise sobre (a causa) é didáctica e para mim até foi “aula”. Mas se tivesses seguido o exemplo do teu colega de especialidade ( E.Macamo) que beneficiou-se do domínio didáctico que tem sobre a matéria e fez a sua leitura sobre os factos terias feito melhor irmão. Veja que nem restou-te espaço para deixar a tua opinião. A propósito, se o meu comentário estiver todo revestido de ignorância sociológica não me enxovalhe, por favor, Hi Vamakweru Sawena...

Elísio Macamo said...

caro patrício, quando foi da última discussão sobre estes assuntos tinha tomado a decisão de dar o assunto por encerrado para não alienar mais as pessoas de boa vontade que querem discutir seriamente os problemas do país. os contornos que a interpretação das manifestações assumiu leva-me a ter dúvidas em relação à minha própria decisão. para mim agora o problema já não é de alienar ou não, mas sim se as pessoas estão preparadas a tomar posição intelectual ou não. portanto, fazes bem em criticar o que consideras contribuição problemática para o debate de ideias. é necessário que esteja claro que há outras maneiras de fazer intervenção pública e que nela o governo não é o único alvo a abater. não creio que estejas a ser intolerante.
caríssimo jaime, estarei aí na próxima semana. convida-me a uns copos para eu tentar convencer-te sobre o que une as várias disciplinas. se tu podes me explicar gestão e eu perceber, então há alguma coisa para além da especificidade da tua disciplina. será a razão? abraços

Anonymous said...

Quital virem viver de verdade em Mocambique e fazerem sociologia aqui e sobre aqui, a ver se encontram essas provas para sustentar esses argumentos, nao tardara a aparecer alguem a dizer sim eu sou corrupto... he he he... Forca e viva a utopia!

Jaime Langa said...

O caro anónimo quer complicar mais a situação. O que E.Macamo e Patrício Langa vão entender por "viver de verdade..." a sorte foi não ter personalizado o "Virem viver..." assim ninguem se chateia a união vai acalmar os ânimos. Caríssimo Elísio Macamo concordo plenamente contigo em relação a Razão. Mas como devo explicar-te Gestão? fica marcado o nosso encontro de copo, pode ser canhú, avise-me logo que chegar, as esquinas são as mesmas é verdade que perdemos alguns participantes. Patrício Força.

ilídio macia said...
This comment has been removed by the author.
ilídio macia said...
This comment has been removed by the author.
ilídio macia said...

"As coisas que não ( me) interessam, simplesmente não comento." Caro Patrício, esta frase é tua. Gostaria que a analisasses com muita cautela e imparcialidade. Para mim,e com o devido respeito, escusado era te pronunciares naqueles termos.

Anonymous said...

uma reacção do Custódio Duma:

http://athiopia.blogspot.com/2008/02/questo-scio-econmica-em-moambique.html