Sociólogo Elísio Macamo convida-nos à combater a credulidade numa série que está a ser publicada pelo Jornal Notícias, e que será aqui reproduzida na íntegra.
Maputo, Quarta-Feira, 29 de Setembro de 2010Notícias
Se alguém nos diz que o Paiol de Mahlazine explodiu por desleixo, aceitamos por acharmos que isso encaixa muito bem na ideia que temos do funcionamento das nossas instituições. Isto é, fazemos uma suposição qualificada sobre a veracidade de uma afirmação que, do ponto de vista prático, pode ser considerada verdadeira na ausência de provas em contrário. Em relação ao paiol, por exemplo, consideramos plausível a ideia de que se trate de desleixo na ausência de outros elementos que poderiam mostrar o contrário. Aceitamos, portanto, a afirmação como sendo provisoriamente certa.
O nosso dia-a-dia está cheio deste tipo de argumentos. Eles obrigam-nos a usarmos o nosso senso-comum para decidirmos se vamos acreditar numa afirmação ou não. A base dessa crença (e desse senso-comum) é o que não fere o nosso sentido do que é normal. Sei que a coisa fica um pouco complicada, porque o que é normal entre nós não é assim tão fácil de determinar. Eu diria, por exemplo, que se alguém me viesse dizer que viu uma pessoa a voar esse relato estaria a violar o meu sentido do que é normal. Sei, contudo, que para outras pessoas isso não seria assim. Aliás, Quisse Mavota mostrou isso. Não obstante, este é um caso que não precisa de nos deter por muito tempo, pois está mais relacionado com a questão da coexistência de várias referências ontológicas no nosso quotidiano. O importante é reconhecer o papel que o nosso senso-comum desempenha na determinação da plausibilidade de uma afirmação e, como exercício crítico, confrontar esse senso-comum.
Na verdade, os nossos problemas com a plausibilidade na esfera pública começam quando confiamos demasiado neste senso-comum. Se alguém nos diz que os distúrbios de 1 de Setembro eram protestos de gente afectada pela carestia da vida reagindo a um governo arrogante e o nosso senso-comum nos diz que há carestia e o governo é arrogante, então concluímos que, de facto, essa foi a causa dos distúrbios. Reparem que, em princípio, não é inconcebível que assim seja, mas no fundo a nossa única base de inferência é apenas o senso-comum. Portanto, argumentos plausíveis são frequentes, mas terrivelmente inseguros. Deixá-los ficar pela plausibilidade é o pior que podemos fazer no espírito da elevação da qualidade do debate.
No fundo, o que a plausibilidade nos diz é que precisamos de mais informação, pois um argumento plausível é um argumento provisório. Com mais informação, sobretudo informação que contraria a nossa afirmação, podemos talvez rever a nossa aceitação da conclusão. As questões que deveríamos colocar antes de fazer eco ao que é plausível são de saber o que precisaríamos de saber para estarmos seguros de que a conclusão segundo a qual os distúrbios foram protestos de gente afectada pela carestia da vida perante um governo arrogante é mais do que plausível. É sintomático que no calor das manifestações nenhuma das pessoas que escreveu textos de análise incendiários a sugerir esta explicação falou com os perpretadores. Há quem simplesmente somou 2 mais 2 e concluiu que só podia ser isso. Agora, atenção que com isto não quero dizer que não tenha sido isso (não sei o que foi), nem mesmo que não tenha havido pessoas que se fizeram à rua movidas por essas ideias.
O que está em causa é a nossa responsabilidade crítica como membros da esfera pública. Estamos dispostos a entrar em confrontação com o que nos é dito ou não? De que maneira o podemos fazer? Batendo simplesmente palmas? Defendendo? Ou interrogando o nosso senso-comum, fonte da plausibilidade do argumento que nos é servido? Penso que a interrogação do nosso senso-comum é o caminho. Interrogamo-lo simplesmente procurando uma base de informação mais sólida. Esta sugestão, por acaso, não vale apenas para o argumento do protesto. Vale também para a sugestão feita pelo Ministro do Interior, segundo a qual estaríamos perante bandidos. Olhando para o tipo de acções que caracterizaram os distúrbios podemos conferir plausibilidade a essa descrição. Mas para que ela seja mais do que plausível seria necessário olhar para a forma como a manifestação decorreu, comportamento da polícia e de diferentes grupos de manifestantes. Aqui também poderíamos constatar que se tratou mesmo de bandidos, ou não. Normalmente, quando vamos para além da plausibilidade colocamo-nos em posição de diferenciar e qualificar os nossos argumentos. Diferenciar e qualificar são coisas muito importantes para a saúde do debate. Nos nossos jornais e na Internet anda muita gente que não vê virtude nisto.
- Elisio Macamo - Sociólogo, nosso colaborador
1 comment:
converse pas cher, burberry outlet, michael kors outlet online, hollister pas cher, timberland pas cher, michael kors outlet online, michael kors outlet online, hogan outlet, kate spade, nike tn, true religion outlet, nike air max uk, michael kors, true religion jeans, uggs outlet, nike air max, nike free uk, north face, ray ban uk, north face uk, true religion outlet, nike blazer pas cher, true religion outlet, michael kors, uggs outlet, abercrombie and fitch uk, lululemon canada, vans pas cher, sac vanessa bruno, nike air max uk, michael kors outlet, michael kors outlet, ray ban pas cher, michael kors outlet, oakley pas cher, nike roshe run uk, polo lacoste, nike air force, ralph lauren uk, coach purses, coach outlet, guess pas cher, new balance, hollister uk, coach outlet store online, sac hermes, burberry handbags, replica handbags
Post a Comment