Sociólogo Elísio Macamo convida-nos à combater a credulidade numa série que está a ser publicada pelo Jornal Notícias, e que será aqui reproduzida na íntegra.
Maputo, segunda-feira, 4 de Outubro de 2010, Notícias
Uma coisa que fomenta a credulidade entre nós é a ideia de que existe uma coisa chamada opinião popular. Por exemplo, ouvimos dizer que na localidade de Longe (na Zambézia) há pessoas que estão a matar outras por acharem que estas estejam a amarrar a chuva; alguns analistas dizem-nos que isso corresponderia a uma crença popular. Os mesmos analistas diriam que essa violência não é irracional em virtude de corresponder a essa crença popular. Ora, o apelo à opinião popular tem uma estrutura argumentativa muito simples. A premissa geral é a seguinte: A (um fenómeno, crença, etc.) é geralmente aceite como sendo verdadeiro. Vamos lá, a ideia de que pessoas possam amarrar a chuva é aceite como sendo verdadeira. A segunda premissa consiste numa presunção: Se A (a crença na ideia de que certas pessoas possam amarrar a chuva) é geralmente aceite como sendo verdadeira, existem, então, razões a favor de A (isto é, da crença na ideia de que certas pessoas possam amarrar a chuva). Notem a circularidade do argumento. A sua conclusão é de que existem razões a favor de A, isto é a favor da legitimidade da crença.
Neste ponto interveem duas perguntas fundamentais. A primeira é simples: que provas existem que sustentam a ideia de que A seja geralmente aceite? A porca torce o rabo neste ponto, pois os analistas que gostam de fazer este tipo de afirmações não gostam de diferenciar. Não conseguem ver que dentro do mesmo povo há os que creem numa determinada coisa, outros que não creem e ainda outros que estão indecisos. Para os nossos analistas é tudo mesma coisa. Só lhes interessa estabelecer que alguém acredita numa determinada coisa e, partindo daí, inferir que a crença é de toda a comunidade. Mas aqui não estou a dizer nada de novo: o importante não é saber que as pessoas fazem, por exemplo, linchamentos em reacção à ausência do Estado; o importante é saber quando e que pessoas fazem linchamentos em reacção a que tipo de ausência de Estado. Igualmente, o importante não é saber que um Estado apreendido como sendo indiferente possa estar na origem da crença segundo a qual os seus próprios agentes estariam a espalhar a cólera, mas sim apurar que tipo de pessoas dentro duma comunidade reagem assim e quando essa reacção se torna violenta. Enfim, o importante não é dizer que a crença na capacidade de certas pessoas de amarrar a chuva é racional do ponto de vista das vivências duma determinada comunidade, mas sim saber quem são essas pessoas dentro de que comunidades que pensam dessa maneira e, sobretudo, porque os outros não partilham essa crença. Estas são coisas elementares não só das ciências sociais como também de qualquer abordagem crítica das coisas da vida.
A segunda pergunta é exigente: mesmo se A é geralmente aceite como verdadeiro existirão razões que nos possam fazer duvidar? Aqui o rabo da porca fica um nó. A primeiríssima razão é que não são todos que acreditam nisso; duvido, por exemplo, que as vítimas destas barbariedades acreditem. A segunda é que não estão todos a participar na matança dos que amarram a chuva. Enfim, a necessidade de compreender não nos obriga a justificar seja o que for. Obriga-nos apenas a situar as coisas no seu devido lugar e, se formos sérios no nosso compromisso com a visão científica do mundo, a não dar crédito a formas excêntricas de pensar só porque queremos “compreender”. Sobretudo quando essas formas excêntricas de pensar reclamam vidas humanas. Não existe nenhum manual de ciências sociais que define a compreensão desta maneira.
Para não ser mal entendido: não estou a dizer que as autoridades policiais devam ser brutais para com todos quantos têm este tipo de crenças. As nossas autoridades dum modo geral têm de ter sensibilidade para o tipo de condições e contextos que não só tornam possíveis estas crenças como também permitem que elas assumam carácter violento. Essas condições e esses contextos precisam de ser estudados, mas a função da polícia não pode ser de suspender a acção por respeito a crenças locais que têm a sua razão de ser dentro de sistemas de valores e concepções do mundo que entram em choque com o tipo de sociedade que queremos construir, sobretudo porque elas ferem o que aprendemos na escola e custam a vida a pessoas inocentes. O membro da esfera pública que defende esse tipo de postura está a colocar-se à margem das coisas. O mesmo podemos dizer em relação a algumas abordagens dos distúrbios de 1 de setembro. Uma boa parte delas parte simplesmente da ideia de que por detrás dos distúrbios estaria uma crença popular no abandono a que o povo foi votado pelo Estado, razão pela qual o povo não viu outro meio de reagir senão pela violência. Não vou insistir com o leitor para duvidar porque não o quero colocar na situação difícil de ser condenado por um coro de vozes que lhe vão dizer “só não vê quem não quer ver!”. Estamos mal. De qualquer maneira o conselho fica: duvide deste tipo de argumento e das pessoas que o apresentam. Duvide, por favor!
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