- Sociólogo Elísio Macamo convida-nos à combater a credulidade numa série que está a ser publicada pelo Jornal Notícias, e que será aqui reproduzida na íntegra.
Quando publiquei, pela primeira, a crítica que o leitor viu nos dois artigos anteriores, Josué Muchanga, um internauta perspicaz, fez o comentário que reproduzo em seguida:
Maputo, Sexta-Feira, 8 de Outubro de 2010:: Notícias
... as privações extremas conduzem necessariamente ao boato e aos linchamentos? Podemos então assumir que em Moçambique sempre que ocorrerem "privações de todo o tipo" teremos que esperar boatos e assassinatos de gente inocente?
Este debate está muito excitante. As contribuições dos intervenientes são magníficas, contudo, a questão levantada pelo anónimo (acima assinalada em itálico) acaba por suscitar outras inquietações, diversas das tratadas por Elísio (Macamo) neste artigo.
A questão em causa é se será razoável transformarmos o estudo do professor Carlos Serra em proposições gerais? Podemos generalizar os resultados do estudo para outras circunstâncias similares? Tenho as minhas reservas. Suponho que este estudo apenas procura perceber e explicar situações particulares de determina comunidade em certa região. Ao tentarmos transformar os resultados de estudo em lei, modelo ou proposições gerais, corremos o risco de repetir os problemas já denunciados primeiro por David Hume e depois por Karl Popper e David Miller, sobre as questões ligadas à validade do método indutivo.
Portanto salvo melhor opinião, julgo que a validade do estudo do professor Carlos Serra circunscreve-se apenas às particularidades e circunstâncias que o determinaram. Ao fazermos generalizações estaríamos a exportar alguns resultados que nada têm a ver com as outras circunstâncias em estudo.
As críticas que teci ao estudo, repito, não o invalidam, nem põem em causa a autoridade científica do autor. Elas põem em causa o modelo explicativo, o mesmo que uma boa parte dos nossos pensadores empregam para abordar os problemas do país. Leis universais do tipo “sempre que o governo for indiferente as pessoas vão agir assim e assado” são úteis, num primeiro momento, como ponto de partida para a formulação de hipóteses e, acima de tudo, para a focalização da atenção num objecto e num universo concreto. No caso da cólera, dos linchamentos ou da chuva amarrada, por exemplo, partimos daí para a descrição das pessoas envolvidas, suas características sociais, suas motivações, sua inserção nos meios em questão e, muito importante, o que os torna diferentes dos outros. Num segundo momento, porém, leis universais são um grande problema porque sugerem um tipo de conhecimento que as ciências sociais dificilmente podem produzir. Sugerem uma capacidade de previsão de fenómenos sociais que o objecto das ciências sociais se recusa a nos disponibilizar. A sociedade constitui-se historicamente e subtrai-se, por essa via, muitas vezes ao olhar vaticinador da ciência. Não é que não seja possível de nenhuma maneira tecer vaticínios sobre fenómenos sociais. Afinal sabemos, por exemplo, que a educação melhora as possibilidades de se conseguir emprego. Mas vejam bem: melhora, não garante. Precisaríamos de um mundo muito bem controlado para realizarmos as nossas profecias.
Quem, sob o peso da credulidade, lê estes estudos como a revelação da verdade viola vários mandamentos formulados brilhantemente pelo Professor Serra no seu “decálogo do sociólogo” no livro “Combates pela mentalidade sociológica”, sobretudo no que diz respeito à atitude crítica. Quem é refém da credulidade facilmente vê nas críticas que eu formulei manifestações do que, segundo um comentário que li na internet, “(É) em meu entender fascinante analisar os discursos ‘analíticos’ (com verniz dito científico) que continuam a ser produzidos para fazer da revolta popular de 1/3 de Setembro uma machamba exclusivamente moral, abundantemente plantada com epítetos, condenações veementes, externalismos causais sem fim e ideias de circunstância que nunca terão continuidade em pesquisa real (...)
“(na verdade, há muitos doutos habitantes de pesquisas que jamais serão feitas, mas que tudo fazem para passar a imagem de especialistas atarefados)”.
Da credulidade passamos facilmente à celebração de soluções mais problemáticas ainda do que o problema levantado. Com efeito, já que a explicação recai sobre o Estado, o instinto totalitário que estimula muitos “críticos” sugere uma revolução, isto é a transformação radical do estado para passar a servir os interesses do povo. Não estranha, na verdade, que ninguém considere oportuno condenar a violência dos distúrbios. Tratou-se, na opinião dos crédulos, duma violência necessária. Esta atitude disvirtua o sentido das ciências sociais e do pensamento crítico. Mesmo partindo do princípio de que não podem prognosticar certas coisas, elas podem contribuir com conhecimento que permita às autoridades, às comunidades e aos indivíduos reagirem com medida e se protegerem das consequências mais nefastas de certos actos. No caso da cólera ou, já agora, de distúrbios por causa da carestia da vida, podemos contribuir com reflexões sobre o perfil dos envolvidos; podemos identificar os mecanismos sociais que falharam e permitiram que a insatisfação desembocasse na violência; podemos investigar as formas de reacção das autoridades e ver em que medida elas podem contribuir para a escalada, e como evitar isso. Enfim, há uma série de elementos que podemos procurar recolher como contribuição não para evitar que certas coisas aconteçam – que isso é quase impossível – mas sim para reagir com maior eficácia às suas consequências.
E. Macamo - Sociólogo, nosso colaborador
Friday, October 8, 2010
Vamos combater a credulidade (8c): Dos das correlações
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