Saturday, October 2, 2010

Vamos combater a credulidade: Dos das consequências - 5

Sociólogo Elísio Macamo convida-nos à combater a credulidade numa série que está a ser publicada pelo Jornal Notícias, e que será aqui reproduzida na íntegra.


Maputo, Sábado, 2 de Outubro de 2010:: Notícias

SUPONHAMOS que estamos a discutir os méritos de deixar meninos da rua guardarem os nossos carros. Alguém podia dizer, por exemplo, que se deixássemos de pagar aos miúdos por esse serviço a criminalidade em Maputo iria aumentar. E como sabemos que a criminalidade não é boa coisa, concluiríamos que não devemos parar com a prática de deixar os miúdos guardarem os nossos carros. Há, evidentemente, uma forma positiva de contrariar este argumento. Alguém podia dizer, por exemplo, que deixar os miúdos guardarem os nossos carros encoraja-os a ficarem longe da escola. E como sabemos que não ir à escola é mau, a conclusão que podemos tirar é que devemos parar com essa coisa de eles guardarem os nossos carros. Reparem que em ambos os casos a forma do argumento é a mesma. Há uma premissa segundo a qual se A acontecer, boas (ou más) consequências vão muito provavelmente advir. A conclusão que se segue é que A não devia (ou devia) acontecer.

Em princípio não há nada de errado neste raciocínio. É normal e frequente no nosso quotidiano. Pode ser problemático quando utilizado em contextos mais sérios onde precisamos de mais informações para chegarmos a conclusões sólidas. Pode ser também problemático quando quem nos ouve não nos interpela devidamente e deixa-se levar pela mera plausibilidade da conclusão. A melhor forma de interpelar tais argumentos é colocando três perguntas. A primeira quer saber quão forte é a probabilidade de que as consequências referidas vão mesmo advir. A pergunta não é inocente. No caso de guardar carros, por exemplo, se alguém dissesse que a consequência seria o aumento da criminalidade caso parássemos, podíamos perguntar se (i) a lavagem de carros é a única alternativa de ganhar dinheiro lícito que esses miúdos têm, (ii) se a nossa Polícia é assim tão má ao ponto de recearmos que ela não seja capaz de controlar a situação e (iii) que tipo de criminalidade vai aumentar e se não haverá formas de a conter, etc. Só analisadas estas questões é que podemos ter a certeza de que a probabilidade apontada seja forte.

A segunda pergunta aprofunda o assunto. Ela quer saber que provas existem, se é que existem, que sustentam a convicção de que as consequências referidas advirão caso A acontecer. Estas provas podem ser experiências de outros países, estudos ou relatórios. Finalmente, a terceira pergunta procura saber se há consequências opostas que deveriam ser tomadas em consideração. Por exemplo, no caso do argumento segundo o qual parar com a prática de deixar os miúdos guardarem os carros poderia conduzir ao aumento da criminalidade poderíamos perguntar se isso (i) não os libertaria para outras actividades úteis, (ii) se isso não obrigaria o município a melhorar as condições de segurança de automóveis através da criação de parques de estacionamento, etc., (iii) se isso não aliviaria os automobilistas da chantagem de alguns desses miúdos, etc. Quer dizer, fazendo estas três perguntas não ponho necessariamente em causa a pessoa que argumenta com recurso às consequências, mas coloco sobre mim mesmo a exigência de ser crítico em relação ao que me é dito.

Na discussão do que fazer face aos distúrbios ocorridos somos constantemente confrontados com o argumento segundo o qual a ausência de concessões por parte do Governo só pode conduzir ao caos. Colocando as três perguntas acima mencionadas podemos facilmente ver que esta é uma conclusão bastante arrojada. Já agora, mesmo o meu argumento contra o mau precedente que estas concessões representam para o nosso sistema político pode ser interpelado desta maneira. Os perigos que qualquer um de nós é capaz de discernir e aventar como hipótese são suficientemente reais. Mas não é o simples facto de nós aventarmos esses perigos que vai fazer com que eles ocorram. A sua simples aceitação pode ser responsável pela inevitabilidade. É por causa disto que vejo com muita apreensão este tipo de argumentos na nossa esfera pública. Se há algum analista que devia estar sob suspeita constante, esse é aquele que argumenta desta maneira. Cada moçambicano devia ser equipado com uma sirene que devia começar a tocar logo que alguém se pusesse a servir este tipo de argumentos ao público. A sirene não teria o objectivo de calar a pessoa, mas de convidar os ouvintes a colocarem as três perguntas propostas mais acima. Só assim é que um pouco de sanidade regressaria à nossa esfera pública.

  • Elísio Macamo - Sociólogo, nosso colaborador


2 comments:

oakleyses said...

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