Thursday, February 28, 2008

Um diagnóstico preliminar das explicações dos tumultos [2].

O grande ausente [fim].

É interessante notar que neste círculo acusatório na base de convicções as duas entidades apeladas são muito abstractas: o “Povo” e “Estado”. O indivíduo (cidadão) desapareceu, como actor da sua própria história. Ninguém sabe do seu paradeiro. A única coisa que sabemos dele é um conjunto de características e adjectivos colectivos e abstractos: deserdado, trabalhador, desempregado, residente dos bairros periféricos, honesto, racional, justiceiro, vive em condições precárias e por aí fora. Não sabemos como se organizam nos bairros. Não sabemos quantos vivem nos bairros “periféricos”? Não sabemos quantos auferem o salário mínimo. Não sabemos quantos são desempregados. Não sabemos quantos são arruaceiros. Não sabemos quantos têm necessidade de apanhar “chapa”, quantas vezes por dia. Não sabemos nada disso. Não sabemos quem é responsável pela limpeza e pela vigilância. Enfim, não temos o cadastro de nada e de ninguém. Somos uma amálgama amorfa.

Os sociólogos, isto para não falar dos outros que nos poderiam ajudar a fazer a etnografia dos lugares sociais que habitamos, já têm uma explicação do tipo (4x4) todo o terreno. O grande ausente da nossa sociedade é o indivíduo, o cidadão. Por isso, não podemos saber que lugares sociais são propensos ao crime, ao linchamento e a assembleia de arruaceiros. Não podemos distinguir um tumulto por causa da subida do preço do pão do tumulto de arruaceiros que com perspicácia sociológica criam distúrbios porque sabem que alguém vai acusar o governo e racionalizar a sua acção. Não podemos distinguir o linchamento intencional (arruaceiro) de outros tipos de linchamento que porventura possam existir. O linchamento é de um tipo apenas e tem sempre fundo político como protesto contra o governo. Aliás, tudo tem cunho político e é protesto. Todos os linchamentos assim como todos os tumultos se devem às tremendas desigualdades sociais, à precariedade social e à inacção do governo (estado). Somos radicais até na teoria!

Então, repito a minha pergunta: como é possível o tumulto?





Wednesday, February 27, 2008

Um diagnóstico preliminar das explicações dos tumultos!

Tentei, há alguns dias, ao que me parece sem sucesso, publicar este texto num dos Jornais nacionais para que mais leitores tivessem acesso as ideias aqui debatidas. Para que o assunto não fique completamente ultrapassado vou publicar o texto em duas partes aqui no Blog.
Primeira Parte

Convicção é a certeza que temos de que as coisas são aquilo que nós achamos que são. Quando alguém se convence de alguma coisa tem a tendência de não procurar estabelecer com certeza o que sabe. Já está convencido. A convicção é, pode-se assim dizer, uma manifestação de certeza. Parte-se do princípio de que já se obteve informação suficiente para se chegar à certeza de que as coisas são de certa maneira e não de outra. Portanto, podemos ver a convicção como uma opinião forte, ou melhor, ainda, como uma espécie de crença.
Não é preciso muito para ganhar a convicção sobre alguma coisa. Por exemplo, aqueles que acreditam na existência de Deus satisfazem-se com a história da Criação. Aqueles que não acreditam em Deus, por sua vez, satisfazem-se com pequenas incongruências nos respectivos livros sagrados das religiões. A maneira como as pessoas se convencem de certas coisas varia em função de várias coisas tais como educação, cultura, religião, astrologia, ciência e por aí em diante. O meu avô, por exemplo, convencia-se da proximidade do tempo da chuva e da chegada da altura de preparar a sementeira quando os pássaros começavam a voar a uma baixa altitude. A sua experiência de observação da regularidade com que isso acontecia dava-lhe razões suficientes para proceder assim.
Muitos dos leitores deste texto provavelmente precisariam de outro tipo de informação para chegar à mesma convicção. Por exemplo, alguns iriam acompanhar os serviços de previsão meteorológica. As duas maneiras de proceder para buscar a certeza são legítimas. No entanto, não se deve confundir a validade do raciocínio e do procedimento com a verdade das proposições. O facto de, na observação do meu avô chover quando os pássaros voam baixo não significa que só chove quando os pássaros voam baixo, nem que sempre que chove seja porque se aproxima a época da sementeira. O tipo de ilações que tiramos em resultado da forma como raciocinamos tem um alcance limitado que precisamos reconhecer.
Sendo assim, gostaria de sugerir a ideia de que as nossas convicções são sustentadas pela validade da informação que temos. A validade, por seu turno, depende da confiança que depositamos na capacidade de determinada informação nos descrever fielmente alguma coisa. Essa informação chama-se evidência. A evidência é, portanto, a informação que justifica e sustenta a convicção. Por outras palavras, a evidência é a informação que indica se a crença ou opinião que temos é “válida”. Esta é uma maneira muito geral de apresentar estes dois termos importantes sobre o processo de produção de conhecimento no geral e científico, em particular. Penso que este nível de elaboração é suficiente para os propósitos deste artigo. Estou interessado em analisar a relação entre as convicções que temos sobre os tumultos e as evidências de que dispomos. Gostaria de acrescentar mais uma ideia antes de prosseguir: só paramos de procurar evidência (informação) quando achamos que aquela que já reunimos é suficiente para justificar as convicções que formámos.
Esta longa introdução era para perguntar que tipo de informação temos ao nosso dispor para o tipo de conclusões que tiramos em relação às causas das manifestações do dia 5 de Fevereiro. Somos capazes de explicar como é que aquele tipo de fenómenos é possível? Qual é a sua causa? As análises que tenho estado a acompanhar desde aquela “superterça” – como a baptizou o jornalista Jeremias Langa – deixam-me com muitas dúvidas em relação ao peso das evidências sobre as convicções. Parece-me que as convicções são muito mais fortes para aquilo que as evidências nos permitem concluir. Numa balança o prato das evidências penderia para baixo. As convicções dos nossos jornalistas, sociólogos, economistas, psicólogos parecem mais fortes do que as evidências que nos fornecem para explicar a algazarra do dia 5 de Fevereiro. Apresento-vos alguns exemplos de convicções para as quais parece-me existir falta de peso na evidência.
Prevalece, por exemplo, a forte convicção de que o governo é responsável pela onda de manifestações porque não se interessa pela sorte do povo. Esta convicção deriva da pergunta: quem é o responsável (culpado)? Esta pergunta, como é evidente, é circular e sugere fortemente a ideia de que existe um culpado. Num país onde tanto se espera do governo e num contexto em que se parte do princípio de que os problemas sociais têm a sua origem na política é natural que esta pergunta seja colocada e respondida dessa maneira. De facto, o governo é o culpado de tudo em Moçambique. Mais interessante do que estabelecer aquilo que já sabemos seria procurar saber um pouco mais sobre o fenómeno em causa para podermos formular perguntas menos óbvias. Por exemplo, que pessoas e instituições intervem nas razões imediatas dos tumultos, qual é a relação entre si, que tipo de situação específica se criou entre si nos últimos tempos e que cadeia de acontecimentos se pode traçar? Duvido que depois de colocarmos estas perguntas e obtermos respostas para elas ainda nos sintamos tentados a considerar a pergunta “de quem é a culpa?” útil e relevante. É claro que a culpa é do governo. Sempre.
Perversamente, porém, o reparo agora feito não revela apenas a falta de informação que é necessária para que possamos tirar conclusões com conhecimento de causa. Ele revela também a ausência de um debate sobre os limites das atribuições e responsabilidades do governo. Essa fronteira parece-me ainda difusa. O sociólogo Elísio Macamo tem advertido, e com razão, para as consequências nefastas desta falta de debate sobre a relação entre o estado e o cidadão. A relevância deste debate para a utilidade do tipo de questões que colocamos na nossa tentativa de percebermos o que se passou no dia 5 de Fevereiro é óbvia. Fala-se de contracto social no nosso país, mas a pergunta é justamente essa: existe um contracto social? Como é que ele é entendido pelas partes contractantes? Que expectativas cria? Como se espera que seja cumprido? Como podemos facilmente ver, falta aqui informação para podermos tirar conclusões sólidas. É mais um caso de muita convicção para pouca evidência (informação).

Predomina também a forte convicção de que se o governo quisesse poderia fazer algo para evitar a carestia da vida. Esta é uma outra maneira de dizer que o governo é que é culpado. Mas poderia mesmo fazer algo? De que maneira? Com relação a este aspecto poderia repetir as questões que formulei acima. A conclusão a que chegaria é de que não só parecemos não conhecer as capacidades e limitações do nosso próprio governo como também fazemos depender a solução de problemas estruturais da boa vontade de pessoas. Temos, portanto, duas grandes questões. A primeira refere-se ao conhecimento público sobre a disponibilidade do nosso Estado. Se as pessoas soubessem de onde vem cada centavo que o governo vai alocar – em forma de subsídio aos “chapas” – para manterem o preço, se soubessem o que é que isso lhes vai custar em termos de fardo de dívidas e de perpetuação da dependência ao auxílio, talvez até se predispusessem a pagar um pouco mais. Ou não, quem sabe? Mas em que fórum isso é debatido?: local, municipal, no governo? Qual é o grau de envolvimento de cada cidadão? Mais uma vez, esse é apenas um assunto do governo. Este é o problema que Macamo atribuiria aos problemas de representatividade do nosso sistema político. Não há espaço suficiente para fazer com que o cidadão lá ao nível do seu bairro, município, distrito ou província saiba dos problemas e das possíveis soluções. Bastam-lhe suposições sobre como as coisas funcionam.

A segunda questão tem a ver com a qualidade da nossa abordagem do problema. A partir do momento em que supomos que o problema seja ao nível de “boa vontade” limitamos muito o tipo de respostas que podemos encontrar. A procura da resposta torna-se na procura de provas da má vontade de quem de direito. Isto não quer dizer, obviamente, que com mais boa vontade não se resolvesse mais problemas. Contudo, explicações que se baseiam nisso limitam bastante o seu próprio alcance. Sobressai a forte convicção de que os tumultos são uma reacção à percepção da inacção do governo. Num contexto em que há assimetria de informação entre o que o governo pode e não pode fazer há espaço fértil para a criação de expectativas falsas. O governo pode tudo, só não faz por falta de vontade política, outra forte convicção. A mesma convicção que alimenta o imaginário social de que a condição de vida “abastada” que os membros do governo levam, não lhes permite ter sensibilidade para as reais dificuldades que o “povo”enfrenta. Convicção, convicção, e mais convicções.
É por tudo isso que o governo deve ser punido. Se pegarmos nas mesmas convicções agora (acusatórias) e as analisarmos com um pouco de distanciamento notaremos que existe fraca evidência (informação) para cada uma delas. Predomina uma forte ilusão da transparência. Essa fraca evidência torna as evidências (acusatórias) num argumento circular. Se o governo não fosse tudo aquilo de que é acusado pelas fortes convicções, então, não haveria desigualdades sociais, pelo menos não nos níveis actuais – que níveis? – não haveria tanta criminalidade – tanta?, não haveria subidas mensais do preço do combustível – não haveria?, não haveria subida do trigo – não haveria? e por tudo isso não haveria razão para a zanga do povo, assim como não haveria porque punir o governo com os tumultos. Só há tumultos, e já agora, linchamentos, porque o governo é tudo aquilo que as convicções afirmam e confirmam. Estamos em presença de formas circulares de raciocínio.
Cada carro de luxo, cada casa no triunfo ou em Beleluane, cada comparticipação em empresas enfim é a evidência de que se esparava para sedimentar as convicções. Mas será mesmo esse tipo de evidências que devíamos buscar para analisar a eficiência ou não do governo no cumprimento das suas atribuições? No fundo, a ostentação de riqueza e bem estar num contexto socialmente precário como o nosso é irresponsável e imoral, sobretudo quando é feita por governantes. Mas não é a repreensibilidade moral deste tipo de comportamento que demonstra a incapacidade e incompetência do governo. O único que o recurso a estas “evidências” faz é dar coerência a uma relação problemática de causalidade, a saber, a ideia de que alguém que ostenta riqueza não presta. Assim, os tumultos acontecem porque o governo corresponderia à representação que se faz dele.
Existe um outro tipo de convicções que não difere das que apresentei até agora em termos do seu teor acusatório. No entanto, este outro tipo de convicções põe mais ênfase numa leitura erudita e racionaliza as acusações. Sobressai a forte convicção de que a causa dos tumultos são os níveis elevados das desigualdades sociais que graçam no nosso país. Esta última vai acompanhada, quase sempre, da outra forte convicção de que o Estado está a se alhear das suas responsabilidades sociais tais como a educação, segurança e a saúde por ter enveredado por uma espécie de “capitalismo selvagem”. Nesse contexto, cada um usa as armas que lhe convém. Uns privatizam esses serviços, no verdadeiro sentido do termo, para fazer lucro. Invariavelmente, esses são os próprios membros do governo. Os “chapas” são, nessa óptica, de familiares e membros do governo. Quem diz os “chapas”, diz também as padarias, as bombas de combustível e por aí em diante. O “povo”, por seu turno, privado desses bens e sem saída, privatiza, em reacção, o monopólio legítimo dos meios de violência. Os linchamentos e os tumultos seriam nessa perspectiva uma reacção a essa privatização dos serviços sociais básicos para a vida dos cidadãos. Os tumultos seriam a reacção à inacção do governo. [Continua].

Friday, February 22, 2008

Os anjos da guarda e os advogados do diábo!

Na esfera publica Moçambicana está-se a favor ou se está contra o governo. Não há meio termo! Não há realidade além do governo. O governo é o principio e o fim de tudo. Os que estão a favor do governo são bajuladores a procura da sua oportunidade para serem ministeriáveis. Os que estão contra o governo são os “verdadeiros” representantes do “povo”. Temos, portanto, os “bem intencionados” e os “mal intencionados. Os primeiros” são os anjos, da guarda, do povo. Os segundos são os advogados, do diábo, do governo. Não existe o mérito da questão. Esta é a carecterização do nosso espaço publico actualmente. Um espaço publico redutoramente problemático e manientado. Um espaço publico que compromete qualquer possibilidade de exercicio de reflexão “descomprometida” dos problemas que afectam a nossa sociedade. O debate de ideias, e por esta via o próprio espaço publico, é o problema que nos impede, hoje, de debater os problemas do país. E se assim continuar estamos ferrados!
Apesar dos sinais de mudança inexoráveis que o nosso espaço público - espaço da vida pública dentro do qual o debate a cerca de assuntos de interesse público pode ser desenvolvido e condicente a formação de uma opinião pública informada - está a experimentar, que no meu entender vão torná-lo, mais aberto, meritocrático e democrático ainda persistem alguns vícios perniciosos. Esses vícios têm sido abordados por alguns dos que participam desse espaço. A “competência no debate” - i’é, a observância de princípios elementares do debate de ideias - ainda constitui um grande desafio. A primeira vista a fragilidade daquela (da competência no debate) parecia um problema de falta de oportunidade para debater e aprimorar essa competência. Esse é um problema que aparentemente podia ser resolvido com mais debates que explicitassem as próprias regras do debate. Todavia a experiencia mostra que a impossibilidade de debater essas regras está tornar impossível o próprio debate. Tudo indica que existem outros factores de ordem sociológica que estão a influenciar a manutenção, reproduçào e resistência de formas perniciosas de debater ideias. Este artigo tenta lançar um breve, porém crítico, olhar sobre alguns desses factores.

Um olhar mais atento dá-nos a entender que a persistência de certos vícios no debate parece ser uma estratégia para evitá-lo ou para fazê-lo refém desses vícios por razões estratégicas. A insistência em debater de uma certa maneira (perniciosa) faz pensar que se trata de um recurso, de poder, uma forma de resistência a mudança do próprio espaço público. Um espaço publico que experimenta a entrada de novos actores que procuram a legitimidade dos seus pontos de vista na plausibilidade argumentativa dos mesmos. A exigência da relevância do argumento pela plausibilidade está a irritar os guardiões de uma forma de debater que previlegiava e se legitimava pela intencionalidade dos arguentes. O mais importante no debate não era a plausibilidade do que se dizia. Melhor, a plausibilidade do que se dizia dependia da intenção de quem o dizia. O quadro interpretativo da intencionalidade já estava pré-estabelicido e consiste da dicotomia: a favor ou contra o governo! Segundo este quadro, redutor,diga-se, o mais importante é mostrar de que lado se esta dos anjos ou do diabo. Esse era o critério de legitimação que está a ser porto em causa com a exigencia de novos critérios de plausibilidade.

Assiste-se a reacção dos guardiãos “gatekeepers” da legitimação pela intencionalidade a sua incapacidade de controlo de novas formas de debater ideias e de formular a opinião pública. A entrada de novos actores nesse espaço com outros tipos de competências está a provocar-lhe ulcéras gástricas aos “gatekeepers” da intencionalidade. Vou tentar ser mais concreto. Há vários recursos falaciosos que têm sido usados no debate para desqualificar os intervenientes que emitem uma posição que não agrada aos “gatekeepers”. O espantalho, por exemplo, é uma das (falácias) estratégicas mais usadas. Caricatura-se a opinião oposta para que assim seja fácil refutar. Além da descaracterização ou má representação do opinião oposta predominam outras formas perniciosas no debate. Ataques pessoais, com explicita intenção de desqualificar a fonte. Enfim, a lista é grande e nela nem preciso mencionar a classica acusação de que se procura ser ministeriável. Hoje quero referir-me ao problema da intecionalidade, mais subtíl, com algum pormenor.

O problema da intencionalidade ou intenção do autor é crítico. Vou tentar explicitá-lo com um exemplo. Suponhamos que pegasse na letra de um hino de uma associação ambientalista e lhe fizesse a análise do conteúdo. Haveria dois tipos de reacção em função do julgamento a que a minha intenção seria submetida. E aqui reside o cerne da questão. Não é o meu argumento que seria avaliado, mas a minha intenção. Se dissesse que se trata de uma composição artístico-literária com conteúdo que expressa consciência de risco ambiental de um grupo social e que diferentemente, das azagaiadas, não faz acusações infundadas e problemáticas, não assenta suas conclusões em premissas bastante questionáveis do ponto de vista argumentativo, poderia suscitar um tipo ou outro tipo de reacção. A reacção, como disse, dependeria de como julgariam a minha intenção – e não o mérito do meu argumento.

Receberia elogios rasgados se achassem que a minha intenção é secundá-los. E críticas azedas se a percepção fosse contrária, repito não importaria de facto o mérito do argumento. O que estou a tentar dizer é que o nosso espaço público está feito refém ainda da maniqueista tentativa de adivinhação da intenção das posições de quem emite opinião. Avalia-se quem disse, e não o que foi dito. Quando o debate toma estas características prevalece a legitimação dos argumentos pela autoridade e não pelo mérito do argumento. Quando uma autoridade se pronuncia ninguém a pode questionar, sob pena de ver sua intenção escrutinada.

As intenções constituem um terreno bastante movediço para nos apoiarmos nelas quando se trata de debater ideias. Como é possível saber quais são as “verdadeiras” intenções de alguém, mesmo quando estas são manifesta e publicamente declaradas “boas”? As “boas” intenções são, quase sempre, populistas e analgésicas para razão! Por isso, o inferno está cheia delas, diz o ditado popular! Enfim, como hipoteticamente defendi no inicio do texto o nosso espaço publico está em processo de mudança inexorável. É uma mudança que está abalar as velhas estruturas de legitimação do que é considerado “bom” argumento. É uma mudança que visa a introdução de outros critérios de avaliacão da plausibilidade e legitimação do ponto de vista. Como em qualquer processo de mudança – estrutural – há sempre resistências. O futuro dirá que tendencia vai prevalecer.

Thursday, February 21, 2008

Em defesa da razão: contra as teorias todo o terreno (4x4)!

O Jurista Custódio Duma escreveu um texto que é um atentado a razão! É um atentado a razão porque não observa os critérios mínimos da apresentação de um argumento coerente. As conclusões que tira sustentam-se na base de um conjunto de falácias argumentativas caracterizadas por: insinuações, apelo as emoções, princípio de não contrádição (uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo), entre outras. Nesta postagem vou apenas dar um exemplo sobre causalidade. Não sei se continuarei com este excercício para todo o texto de Duma, pois cada frase nova introduz argumentos cada vez mais problemáticos, pelo que continuar a analisar séria o mesmo que insistir em alvejar uma presa ferida!

A Relação de causalidade.

1) "A revolta popular do dia 5 de Fevereiro, teve como causa o elevadíssimo custo de vida e a ausência de serviços públicos para satisfazer as necessidades básicas dos cidadãos” (Custódio Duma).

A frase acima expressa a conclusão mais categórica do texto de Duma. Nela Duma estabelece uma relação de causalidade entre dois fenómenos: a “revolta popular” de 5 de Fevereiro [x]e a ausência de serviços públicos para satisfazer a necessidade dos cidadãos [y]. Uma relação de causalidade pode ser entendida como o conjunto de todas as relações de causa-e-efeito. Ainda não fui claro. Um exemplo: Imaginem que estamos numa sala de onde nossa vista consegue alcançar a única porta de saida. Estamos sentados e temos um gato por perto. Derepente vemos uma bola rolar atravessando a porta. A nossa primeira reacção, instantânea, é olhar para o lado oposto da direcção que a bola toma. O gato, por seu turno, não faz nada disso, põem-se a correr, saltitando, atrás da bola. Bom, o que informa a nossa acção de olhar para trás e tentar perceber o que faz aquela bola rolar naquele sentido (trajectória) é o principio de causalidade que opera em nossa cabeça. O principio da causalidade é uma propriedade da razão (O filósofo Emmanuel Kant considerava-a uma categoria aprioristica tal como o tempo e o espaço). Sabemos que para uma bola rolar em determinada direcção é porque alguma força lhe foi aplicada e actua no sentido contrário da direcção que a bola toma. O gato, por ser irracional, não partilha do mesmo principio.
As causas por detras do rolamento da bola podiam ter sido várias: alguém podia ter chutado a bola, podia ter sido a força do vento a empurar a bola, enfim N possibilidades. Imagino que todos conheçam a lei da queda livre dos corpos. A queda da maçã era muitas vezes evocada pelos professores de física para nos meterem na cabeça essa lei de Newton. Se uma maça cai, diziam, a causa de sua queda reside na força de gravidade da terra que actua sobre todos os corpos suspensos. Penso que um jurista da craveira de Duma devia estar a par deste principio básico que afinal é crucial para sua própria profissão. Diz-se, em direito, que a causalidade é a relação factual entre ( x) e o resultado (y). Chama-se a essa relação de nexo causal. O que faz Duma fazer vista grossa a esse princípio quando analisa a sua sociedade?
Existem vários tipos de causalidade ou de relações de causalidade. Não vou poder abordar todos, por economia de tempo. Vou referir-me apenas a dois tipos gerais e três subtipos. Quando um efeito resulta de uma única causa estamos perante uma relação de unicausalidade. Quando, por sua vez, o efeito resulta de várias causas estamos perante uma situação de multi ou pluricausalidade. Há fenómenos que pela sua complexidade não nos permitem de imediato estabelecer um nexo directo e unicausal. Nesses casos recorre-se a construção de modelos causais. O primeiro passo para a construção de um modelo causal é o levantamento de todos elementos e componentes que achamos relevantes para a ocorrência do fenómeno. No caso das manifestações poderiamos proceder dessa meneira. Esse exercício permitir-nos –ia distinguir :

a) “causa necessária– factor mínimo fundamental para a ocorrência da “revolta popular”!
b) causa suficiente – factor que, quando presente, garante a ocorrência da “revolta popular”.
c) “causas componentes - factores, supostamente, de menor importância que, quando associados, podem tornar-se em causa suficiente para “revoltas populares”. Como habitual, o sociólogo Elísio Macamo escreveu um excelente texto elucidativo sobre o tipo de relação causal que podemos encontrar ou não entre as manifestações do dia 5 de Fevereiro e uma série de váriáveis ( fenómemos). Quem lê esse texto a partida descarta a conclusão apressada de Duma que coloquei logo no inicio desta postagem. Leiam o excerto alargado do texto de E.M mas abaixo, ou todo o texto aqui.
Excerto alargado!
(...)"Porque é que houve manifestações no dia 5 de Fevereiro? Podemos entender esta questão também como um convite para explicarmos esta ocorrência singular no contexto geral da nossa esfera pública. Porque é que ao invés de as pessoas irem trabalhar normalmente como o fazem todos os dias, algumas delas foram à rua fazer o tipo de coisas que fizeram? Aqui seremos obrigados a fazer deduções que nos apontam para vários caminhos. O que está em questão nesta pergunta já não é a identificação de características que associamos à noção de “manifestação”, mas sim a própria ocorrência. Assim, podíamos simplesmente descrever o contexto dentro do qual a manifestação ocorreu (ou teve mesmo que ocorrer). A pergunta é: que condições foram necessárias para que a ocorrência tivesse lugar? O aumento do preço do “chapa” foi uma condição importante, mas a pergunta – uma pergunta que é raramente colocada – é de saber em que medida. Aqui as coisas complicam-se e os que gostam de fórmulas simples continuam a ler a seu próprio risco. Talvez seja oportuno introduzir uma distinção muito importante entre condições necessárias e condições suficientes para que algo ocorra. Uma condição é suficiente quando ela é catalizadora imediata de um determinado evento. Por exemplo, se alguém é baleado mortalmente podemos dizer que a causa (a condição suficiente) da sua morte foi o projéctil que se hospedou nos seus pulmões. Uma condição necessária é um pouco mais complicada, pois envolve tudo quanto deve ocorrer para que a condição suficiente tenha o efeito que imputamos. Assim, no caso da pessoa baleada mortalmente há uma série de condições necessárias, nomeadamente que alguém tenha disparado, que a arma não fosse nenhum brinquedo, que o alvejado não tivesse colete anti-balas, etc. Estas considerações levantam questões em volta do que significa dizer que as manifestações foram causadas pelo aumento do preço do chapa. Em que medida? Qual é a relação exacta entre o aumento do chapa e a manifestação? Aí alguns socorrem-se legitimamente das condições necessárias que incluem a indiferença do governo, a precariedade geral da vida nos centros urbanos do país, o desespero dos jovens e uma série de outros factores que aduzimos para proporcionar contexto para a ocorrência. Reparem que não estou a levantar a bicuda questão de saber como se faz este salto explicativo de certas ocorrências como sendo a causa de uma outra. Porque é que o aumento da tarifa do chapa, por exemplo, leva as pessoas a manifestarem-se? E a manifestarem-se contra o governo? Porque não o fazem contra os chapas eles próprios? E porque a manifestação é naqueles moldes? Porque é que as pessoas não marcharam para o parlamento e baixaram as calças? E saias, já agora? Estas perguntas todas convidam-nos a aduzir mais ocorrências que vamos integrando numa cadeia causal que, no fundo, não estabelece nenhuma relação directa entre o que julgamos ser a causa e o efeito”. (fim do extracto:retirado do http://www.ideiascriticas.blogspot.com/).
Como podeis ver as conclusões de Duma, além de precipitadas, representam um atentado a razão. Se achar conveniente poderei voltar as muitas passagens e exemplos de argumentos falaciósos que abundam o texto de Duma.

Para terminar deixo-os com algumas frases para que cada um faça a sua análise.

2) “A imagem que nos é mostrada é de um povo que para além de ser explorado é punido com a falta do básico que necessita para sobreviver”. (C.Duma)

O que é ser explorado? Quem é o explorador? O que é punir? O explorador fâ-lo para punir? A punição define a exploração ou vice-versa? Porque razão? Que interesse têm o explorar em punir o povo? O que ganha com isso? Como podeis ver está frase faz apelo as emoções. Usa termos de maneira bastante irresponsável e inflamatória sem os clarificar. O que é que Duma considera como básico, por exemplo? O básico para ele é igual ao básico para um governante, por exemplo, e já agora, ou para um "deserdado"?
3) “Enquanto isso, os criminosos andam à solta e saqueiam o pouco que as pessoas têm sob o olhar tímido das autoridades”. (C.D)

4) “As próprias autoridades, sempre que podem, dedicam-se a saquear o cidadão, principalmente os que se encontram nas estradas, como fiscais e polícias”.(C.D).

A teoria 4x4 de que falo é aquela em que todos os problemas descritos por Duma resultam da apatia do Estado e do Governo. Resulta de uma di-visão simplista da realidade entre governo explorador e governados (povo) sofredor, martirizado, explorado! Uma teoria da falta de vontade do Estado e do Governo de resolver os problemas do povo. E porque é que essas coisas são assim? Ninguém explica! Não vale dizer que é porque o Estado é explorador, corrupto e pronto, isso faz parte do problema descrito e a ser explicado. Porque é que o nosso Estado (governo) é explorador, corrupto etc? É uma caracteristica essencial deste? Como podem ver não sairiamos desta cadeia circular de uma téoria de conspiração que nada explica, só insinua com generalizações absurdas e uso discuidado de terminologia rebuscada. É a isto que não me canso de chamar de senso comum erudito. Com uma critica - absolutamente pobre - como está não há governo que se incomodaria no mundo!

Wednesday, February 20, 2008

Senso-comum erudito!


Este texto é um comentário alargado ao texto de Elísio Macamo "Xithlangu II" que pode ser lido aqui.

Li e reli a postagem que o “Diário de um sociólogo” faz sobre o estudo dos linchamentos e a atitude dos que opinam mesmo sem ter estudado o fenómeno. Eu sou um dos que vai continuar a opinar mesmo sem ter feito estudos empíricos sobre linchamentos. Li também a entrevista do vangloriado sociólogo Brasileiro, tendeciosamente, trazida para debate. Como bem diz o Elísio Macamo repetem lugares comuns. É a isto que chamo de senso-comum erudito. Dizer lugares comuns com linguajar sociológico, neste caso! Eu participei do primeiro seminário publico onde se apresentaram os resultados do estudo sobre os linchamentos em Maputo e Matola. Fiz a minha intervenção alí na sala, em público usando o microfone. Não mandei indirectas. Solicitei, ao professor Carlos Serra, a quando da tão publicitada visita da investigadora brasileira dos linchamentos, que nos providenciasse o texto preliminar antes da apresentação publica para permitir um melhor debate sobre o assunto. Solicitação para a qual tive resposta positiva, mesmo que nunca se tenha cumprido. No primeiro seminário, Carlos Serra e a sua equipe multidisciplinar, tomaram notas das intervenções dos participantes. Não foi o único a falar nesse dia, várias pessoas na sala colocaram questões metodologicas pertinentes. Recordo-me por alto que o Jornalista Ercinio Salema questionara o uso das notícias saidas no jornal como indicador fundamental para sugerir a variação dos niveis de ocorrência do fenémeno. A ideia de Salema era simples, mas crucial. Nem sempre os jornalistas estão com a mesma disposição para reportar sobre os linchamentos. Os dados do jornal são por si só insuficientes para inferir sobre a variação dos níveis de ocorrência dos linchamentos. Num país como o nosso onde se acredita que o governo é ominipresente e omnipotente, pode ser que um jornalista achasse que algum "superior" não iria gostar de saber que houve mais um linchamento para não comprometer a imagem da polícia e, simplesmente, não reportar. Se os jornalistas não reportassem, não haveria linchamentos, alertava Salema. A intenção mais uma vez não é sugerir o não recurso as notícias, mas alertar para o cuidado da leitura que se faz(ia) a partir desse dado problémático. O reportado não é o real, é uma selecção construção do real. Nesse caso o critério de selecção é uma aspecto metodológico fundamental a considerar.

O jornal Savana que se encontrava no local entrevistou-me após o seminário. Repeti precisamente o que havia dito em público para a equipe de pesquisa liderada por Serra. Assim como o Elísio, levantei questões, metodológicas, sérias sobre o trabalho. O estudo tirava conclusões demasiado ousadas para tão problemática metodologia. Um exemplo disso surgia da própria amostra. Carlos Serra, e sua equipe, entrevistara 27 (?) pessoas. Todos(?) ou boa parte dos esntrevistados eram funcionários da Universidade Eduardo Mondlane. Dizia o estudo que eram residentes nos bairros (locais do crime) onde ocorrem os linchamentos. A relação de poder – formal - que existe entre Carlos Serra e os trabalhadores da UEM seria um primeiro aspecto a considerar sobre a fiabilidade dos dados produzidos por essas pessoas. Podiamos questionar até que ponto elas estavam a vontade para falar o que falaram? Podiamos questionar se não responderam aquilo que imaginavam que o ilustre professor (seu superior hierarquico na UEM) esperava delas.
Estudo mais cuidadoso apresentaria o critério de selecção dessas 27 pessoas, mesmo assim. O que se fez foi apenas justificar que não era possível falar com as pessoas no local porque tinham medo de represálias, dai o recurso aos trabalhadores. Usou-se no seminário a expressão: cultura do silêncio, para se referir ao medo de falar! A palavra parece rebuscada para se referir a algo vulgar! Quem queriria falar depois de um linchamento? Mesmo eu- académico- numa situação dessas feichava a boca a sete chaves! Esta observação não era para dizer que não se devia ter entrevistado esses trabalhadores. Queria apenas dizer que havia grande a possibilidade (probabilidade) de obter respostas enviasadas e portanto seria importante considerar outras alternativas metodológicas. Falei também de um problema recorrente com a tentativa insistente e persistente de racionalizar ao invés de explicar/compreender os fenómenos. Enfim, falta muita modestia nas conclusões do estudo sobre os linchamentos.
Quem disse que naqueles lugares onde não existem desigualdades sociais - se é que existem esses locais, ou pelo menos em que aquelas não são acentuadas extremas - não há linchamentos? A própria entrevista do sociológo Brasileiro, citada por C.S, apresenta uma tese que contrária esta ideia. Há linchamentos urbanos, por exemplo. Voltemos aos 27 trabalhadores. Que competência esses têm para falar dos lincamentos em seus “supostos bairros”? O que representa a sua opinião? Porque esses e não outros? Eu dizia, algures, que o linchado assim como o suicida Durkhemiano já não estão para contar a história. E aí o que se faz? É um desáfio metodológico. Uma etnografia dos “locais do crime”, por exemplo, no mímino, seria um forma de começar. Eu cresci no bairro da Liberdade, Matola. Um bairro com caracteristicas similares aos considerados "suburbanos"- periféricos pelo estudo. Sim, pode ser. Mas no enorme bairro da liberdade, a disposição, o tipo de casas, “a classe social” dos habitantes, só para citar alguns exemplos do local é bastante diversificada. Remeter todos os habitantes dos bairros "periféricos" para a categroria homegéna de deserdados, vivendo em condições de precaridade social embelezado coma ideia de um Estado ausente é querer tapar o sol com a peneira. Não existe uma tendencia linchatória na liberdade, por causa dessas ccondições, mesmo que por lá ocorram, de vez em quando, linchamentos. Não é preciso ter feito estudos empíricos sobre linchamntos para seguir a lógica de um argumento. Se fosse preciso estudos empiricos para tudo não teriamos a "grande teoria"- também problemática – dos sismos sociais. É preciso modestia para fazer ciência!
Recomendo, mais uma vez, aos leitores deste espaço para que leiam a reacção de Elísio Macamo aqui.

O poder invisível dos superiores!

Imaginem que alguém comprasse um pacote inicial de girinho! Depois começasse a enviar sms para alguns números, e os receptores fizessem o mesmo, com o seguinte teor:

Ouvi um director dizer:
"dizem que a canção insulta o presidente da Republica..."
Outro disse:
"Eh! Não quero problemas...é melhor não tocarem isso."
E outro ainda:
" Recebi uma chamada de superiores a mandar parar de tocar Azagaia..."”.
Tirei estas frases daqui.

Estas frases são apenas um exemplo, podia ser qualquer outra com teor similar. Quantos, em Moçambique, iriam duvidar ou pôr em causa a conclusão tirada a partir destas frases de que existe censura no País? Reparem. Não estou a dizer que não existe ou que existe censura. Estou a dizer que temos, muitos de nós, a tendência de tirar conclusões fortes na base de envidências bastante escassas e problemáticas (incluindo o relatório - atribuido ao MISA, do MISA que circula pelos E-mails). Estou a tentar questionar porque razão nos contentamos com tão pouca informação, e nos acomodamos com tão fracas evidências para sustentar fortes convicções (conclusões). Que mecanismo é esse que opera na nossa sociedade que torna o absurdo ( no sentido lógico) plausível?
Quando se têm convicção da existência de algo (censura), essa convicção é real nos seus efeitos, não importando, portanto, sua existência real: só não vé quem não quer ver, diz-se!
PS: Sobre o Relatório atribuido ao MISA!

Quem é o Jornalista que voltou a correr para redacção por ter recebido uma “ordem superior” para não reportar sobre as “manifestações” do dia 5 de Fevereiro? Segundo o relatório foram vários e de vários orgãos (mesmo privados – estranho!). Esses orgãos ainda se deviam chamar de privados?A pergunta que me ocorre (pode ser por ignorância da profissão de Jornalista) é a seguinte: afinal, quem é o chamado quarto poder? Como se exerce esse poder? Como é que esse poder pode se deixar manientar, assim, num contexto político “democrático” – pelo menos legalmente – como o da nossa sociedade? Qual é o Jornalista que não sairia "heroicizado" - Já que vivemos numa sociedade em que falar é considerado acto heróico - se tivesse recusado essa “ordem superior” e viesse em público assumir isso? Esse Jornalista seria contrado pela CNN ou BBC com certeza! Se o jornalista se submete ao poder - “Todo poder (simbólico) é um poder capaz de se impor como legítimo, dissimulando a força que há em seu fundamento e só se exerce se for reconhecido. Ao contrário da força nua, que age por uma eficácia mecânica, todo poder verdadeiro age enquanto poder simbólico” (Bourdieu,1977) – dessa forma com todos os recursos de “poder” que em principio têm, de quem é a responsabilidade? Quem está a comprometer a liberdade de imprensa e de informação aqui? Como é que uma “ordem superior”, melhor que tipo de “ordem superior” consegue intimidar “toda” imprensa e esta, simplesmente, se deixa intimidar. Não será caso para exigir responsabilidade não apenas ao “superior” de onde emana a ordem mas também ao “inferior” que reconhece na “ordem superior” a infracção de um direito consagrado na constituição e na lei de imprensa e mesmo assim aceita cumpri-la?

Bayano, ajudas a pensar este assunto?

Tuesday, February 19, 2008

Notas sobre (des)honestidade académica!

Em finais do ano passado (2007), convidei o Jurista Ilidio Macia para fazermos uma reflexão juridico-sociológica sobre a questão da (des)honestidade académica no nosso país. Convite que foi, gentilmente, aceite. Por razões académicas, não tive tempo suficiente para prosseguir com a ideia para a qual já havia feito algumas notas. Espero um dia poder(mos) continuar com a referida reflexão. Este assunto ressurge a próposito de uma “polémica” que se arrasta há algum tempo sobre o plágio de um livro do Professor Rafael da Conceição, cuja publicação anuncei aqui . O debate sobre o plágio da capa do livro do professor Rafael pode ser acompanhado aqui.
Na mesma altura, o Jornal eletrônico, Canal de Moçambique, havia postado um texto reportando o caso de um estudante, de uma instituição de ensino superior privada, suspeito de ter copiado a tese de licenciatura na faculdade de direito da UEM. Leia aqui. Pensei, na altura, que o assunto era sério demais para ser deixado apenas ao nível do debate jornalístico. O Jornalista Luis Nhachote fizera um trabalho notável ao abordar o assunto. No entanto, pensei que o assunto estivesse a ser tratado de forma algo superficial, resumindo-se ao aspecto jurídico da ausência de legislação para punir plagiadores. A superficialidade devia-se, também, a escassez de dados e crítérios claros sobre o que se estava a chamar de plágio. Havia, também, lacunas em termos da informação que nos pudesse ajudar a compreeder efectivamente o que acontecerá. Todavia, pensei que esse episódio seria um “bom” ponto de partida para sugerir uma reflexão além da jornalística sobre a honestidade académica no nosso país.
Nos ombros de gigantes”!

Esta expressão é a tradução do Inglês “On the Shoulders of Giants”, atribuida ao físico e cientista Isaac Newton. Preencher os hiatos de conhecimento já existente é a razão de ser do empreendimento académico. O processo de produção de conhecimento na academia implica, quase sempre, o recurso as ideias de outras pessoas. Na academia, assim como em muitas outras esferas da vida, o que conta mais é a inovação e não, necessariamente, a invenção do pneu. O pneu já foi inventado: costuma-se dizer. Nos escritos académicos, em particular, só têm pretensão de originalidade quem não é bem lido. Os bem lidos sabem reconhecer a fonte de suas ideias mesmo quando inovadoras. É por isso importante distinguir o que é nosso produto (ideia) do que é emprestado. A honestidade académica consiste, portanto, no uso legítimo e apropriado das ideias de outras pessoas para produzirmos as nossas próprias e contribuir-mos dessa maneira para a inovação e progresso do conhecimento. As instituições de ensino superior desenvolveram, por isso, um conjunto de instrumentos metodológicos que nos permitem usar correctamente as ideias de outras pessoas sem as plagiar. Refiro-me aos sistemas de referência das fontes bibliógráficas e as regras de citação. Esses dispositivos, no entanto, não se restringem apenas as instituições de ensino superior. Algumas organizações profissionais também adoptam mecanismos que consideram convenientes para permitir o uso de seus produtos intelectuais assim como para regular esse mesmo uso protegendo a propriedade intelectual de seus autores. Por exemplo, o patenteamento de marcas de produtos e/ou tecnologias serve para isso.

Os académicos, incluido os estudantes, devem, pelo menos deviam, estar familiarizados com os diferentes modelos de regras de citação e referencias bibliográficas disponíveis através de guiões e códigos de ética que as universidades disponibilizam. A ética académica é um aspecto fundamental pois define o que é considerado certo e o que não é na vida académica. É também um acto de muita responsabilidade. É que o trabalho académico, seja o de profissionais assim como dos estudantes, é acima de tudo uma forma de conduta humana. Assim sendo, essa conduta deve se conformar as normas e valores partilhados naquele meio. Como em qualquer outra esfera da vida em sociedade, certos tipos de conduta são moralmente aceites enquanto outras não. Podíamos nos questionar sobre quem decide o que é moralmente aceite ou não na conduta e na vida académica. A resposta seria a própria comunidade académica. Como dizía, a pouco, ao longo do tempo a comunidade académica nas universidades e as associações profissionais, em particular, desenvolveram códigos de conduta para regular o comportamento de seus membros. Esses códigos de conduta podem variar de instituição para instituição e até de disciplina para disciplina. Por exemplo, existem instituições como a universidade Eduardo Mondlane que não têm um guião específico de regras de citação e ética de pesquisa para os sociólogos. Nessas circunstâncias os sociólogos da UEM podem recorrer e se orientar pelas regras estabelecidas pela Associação Internacional de Sociologia (AIS) se quiserem fazer parte dessa comunidade. O mesmo se aplicaria para outras disciplinas, cada uma com seu grau de especificidade.
Estudar a desonestidade!

A desonestidade académica é um assunto de extrema importância que no contexto Moçambicano ainda não recebe a devida atenção. Um exemplo flagrante dessa falta de atenção é a absoluta inexistência de qualquer tipo de estudo que nos dê uma ideia da formas de manifestação do fenómeno nas instituições de ensino. As vésperas dos exames de admissão para as universidades públicas têm sido as únicas e raras ocasisões em que figuras ligadas a universidade e ou a imprensa se referem, também de forma indirecta e esporádica, a questão da des-honestidade académica. A fraude académica - expressão que nos é mais familiar, por extravio de provas/ exames antes das datas oficiais de sua realização - constitui a forma, aparentemente, mais visível que surge no discurso público sobre a desonestidade académica em Mocambique. Fora disso, pouco ou quase nada se sabe e se fala das diferentes formas em que se manifestar a deshonestidade académica e muito menos os recursos jurídico-legais e institucionais que sancionam esse tipo de práctica. Eis, portanto, um campo que precisa ser explorado.

Tuesday, February 12, 2008

Por uma sociologia clínica da greve!

Em 2004 publiquei, com o mais criativo e produtivo dos sociólogos Moçambicanos da actualidade, Elísio Macamo, na agora fantasma Revista Mais, um artigo com o controverso título: - “A dupla maldição que é a democracia”. O artigo pretendia ser uma reflexão sociológica tentativa e preliminar sobre o fenómeno da greve no contexto da nossa sociedade. Em causa estava uma greve dos estudantes da Faculdade de Letras e Ciências Sociais da Universidade Eduardo Mondlane(FLCS/UEM)[1]. Os estudantes protestavam, entre outras coisas, pela melhoria das condições em que decorriam as actividades de ensino e aprendizagem, nomeadamente melhores salas de aula e melhores anfiteatros. Queixavam-se, também, da ineficiência da Unidade de Gestão de Espaços Comuns (UGEC)havia dois anos introduzida naquela instituição precisamente para racionalizar o uso dos espaços constrangido pelo crescente numero de novos ingressos. As salas, diziam os estudantes, não estavam devidamente iluminadas, nem climatizadas. Achavam inconcebível ter de andar de uma faculdade para outra para assistirem às aulas, uma fez o anfiteatro situado na sua faculdade ter sido alocado a outros estudantes. Por seu turno, a UGEC reconhecia parte das reivindicações assim como a sua incapacidade para oferecer melhores condições, imediatas, em termos de sala de aulas, ar condicionados devido escassez desses recursos. Enfim, estou a fazer curta uma longa história. Analisadas as posições, das partes em contenda, era possível encontrar razões plausíveis para as suas decisões. O problema transcendia a capacidade de cada uma delas para por termo ao diferendo. É um problema estrutural que persiste hoje quatro anos após a greve desses estudantes alguns dos quais devem fazer hoje parte da UGEC. A única solução que parecia sensata, negociar, foi o último recurso após a escalada.

Partir para a greve, instantânea, foi a atitude dos estudantes perante a leitura que faziam do que seria a causa dos problemas que enfrentavam. Fecharam as salas de aula com cadeados e correntes, proibiram os professores de fazerem seu trabalho, enfim, inviabilizaram o funcionamento da faculdade. Nesse exercício nem sequer observaram os direitos daqueles que não estavam directamente implicados com a situação, por exemplo, estudantes das faculdades vizinhas que usavam os mesmos acessos. A luta pelo seu direito sobrepôs-se ao direito de outros estudantes, como os da faculdade de educação sita no mesmo edifício.

A nossa intenção ao fazer a leitura da situação daquele caso específico – que por sinal se repete um pouco nas diferentes formas de manifestação no nosso país, “Madjermanes”, “Chapistas”, tumultos – foi perceber a predisposição para a escalada. Porque é que na reivindicação de direitos consagrados tendemos a optar por tudo ou nada? Atende-se ao que exigimos ou ninguém faz nada! Baixa-se o preço do “chapa100” ou queimamos os “chapas100”, baixa-se o preço do combustível ou fazemos escaramuças nas bombas e por ai em diante.

Se as manifestações constituem um direito consagrado no nosso país, a falta de espaço de negociação entre as partes que dá lugar a escalada parece reflectir a perversidade desse espaço ou direito. Num mundo ideal – sugerimos – o simples apelo a possibilidade de greve seria suficiente para activar mecanismos reguladores e espaços de negociação entre as partes para evitar a escalada. O que acontece na nossa sociedade é apetência para a escalada. Essa predisposição, invariavelmente, faz todas as partes saírem a perder ou uma delas a celebrar falsas vitórias. Ganha-se a batalha, mas perde-se a guerra. Uma vitória falsa seria, por exemplo, a que está a ser comemorada agora com a trapalhada que o governo fez ao precipitadamente intervir, como o fez, no caso dos tumultos de 5 de Fevereiro passado, mantendo o preço anterior da tarifa dos “chapas”.

A pergunta que nos devíamos colocar é se estarão todos os factores, ou pelo menos os principais, que determinam a subida dos preços do combustível e dos “chapas” sob alçada do governo? Duvido? Enquanto, não começarmos a colocar-nos este tipo de questões, a escalada será sempre a opção. Alguns defendem que o povo pacato não entende nada dos argumentos técnicos sobre lógica por detrás das subidas dos preços. As mesmas pessoas já não acham estranho que o mesmo povo seja tão competente ao saber a quem exigir as contas. O governo. Mas podem ter alguma razão exigir que o governo faça tudo tornou-se um habitus paternalista que está agora a ter seus efeitos perversos. O governo, neste caso na nossa sociedade tornou-se numa espécie de bode expiatório para todos os problemas. Tudo que vai mal é por culpa do governo. E isso por culpa própria do governo, Já agora! A culpa reside no facto de o governo alimentar a falsa expectativa de que pode tudo, quando na verdade pode muito pouco. Pode controlar o preço dos “chapas”, do combustível, do pão e por ai em diante colocando-se uma corda sobre seu próprio pescoço. Se o governo pudesse porque não o faria? Cinismo meu? Ao fazer as pessoas pensarem que pode tudo, o governo retira ao indivíduo, sem se aperceber, qualquer espaço de acção. Fica um governo omnipresente e omnipotente mesmo sem esse poder. Esse espaço para acção do indivíduo seria importante mesmo que se limitasse a permitir questionar a razão de ser dos problemas. Esse é o primeiro passo para busca de solução. Ao invés disso opta-se pela escalada, que eclipsa qualquer possibilidade de reflexão. A escalada é sinal de que ainda precisamos de algo mais no exercício da nossa democracia nos seus níveis micro e meso sociológicos. Esse nível é aquele em que o cidadão recupera o espaço de acção e iniciativa de formulação e solução de seus problemas. Com isto não quer sugerir que o estado se deva alhear das tarefas que lhe são atribuídas. Quero dizer que precisamos de começar a estabelecer os limites dessas tarefas, nenhum governo pode tudo, por mais boa vontade que tenha!

A greve

A greve, em si, não é um fenómeno novo na história da sociologia. Há quem considere até que está na génese daquela disciplina. Todavia, a maneira específica como ela se realiza no nosso contexto é sui-generis e por isso mereceria um olhar sociológico mais decoroso dos académicos para produzirmos conhecimento prudente sobre as suas condições de possibilidade. A greve, posso até dizer com alguma cautela, e os tumultos são das expressões mais significantes da liberdade que a democracia preconiza. Um dia antes dos tumultos de Maputo e Xai-Xai, alegadamente devido a anunciada subida do preço dos chapa100, conversei com um colega Queniano. Pedira-o uma sua leitura da tensa situação política de seu país. A resposta foi soberba, mas pareceu-me plausível. As manifestações no Quénia, após as eleições de Dezembro, mais do que o próprio acto de votar, foram a expressão mais alta da existência de democracia naquele país asseverou.

No entanto, a estabilidade daquela democracia, que muitos aplaudiam, não passava de ilusão de óptica pois assentava em instituições frágeis. Essa fragilidade das instituições tornou vulnerável a democracia. A fragilidade pode-se observar pelo simples facto do presidente ter podido mandar antecipar a divulgação dos resultados sob seja qual for o pretexto. Um país não se pode permitir esse tipo de ingerência. Para Gerald, nome do meu colega, os quenianos haviam aprendido o poder do voto quando o usaram para remover Daniel Arap Moi do poder. Foi a exigência da reposição legítima do poder instituído democraticamente que esteve na origem dos tumultos no Quenia e não a ausência da democracia ou efervescência étnica com se vaticina por aí. A democracia, bem ou mal, já estava naquele país. A questão era domestica-la para que não se virasse contra os próprios cidadãos. Para tal, era preciso seu exercício efectivo através do alargamento da base de representação e participação dos diferentes interesses nos espaços de negociação. O que não aconteceu.

A dupla maldição, conforme eu e Macamo sugerimos, resulta da situação que nos colocaria a perder com ou sem a democracia. A democracia é, portanto, um mal necessário. Uma faca de dois gumes. Por causa dos constrangimentos que não nos permite o seu exercício efectivo ela pode tornar-se perigosa. Estamos por isso confrontados com o sério desafio de repensar o político no país no sentido de arriscar mais democracia para o bem da própria democracia. Precisámos reflectir sobre mecanismos institucionais e sociais que pudessem levar as partes em conflito a serem menos radicais, sem alienar seu direito democrático de reivindicação. A greve, aqui, é como a arma do polícia só pode ser usada em casos estritamente necessários quando a sua própria vida corre sério risco não tendo outra alternativa senão disparar contra o seu alvo.

O estudo dos tumultos.

Há muito tempo que sociólogos têm se interessado pelo comportamento de multidões, frequentemente, pensado como sendo um fenómeno das sociedades modernas e industriais. Teorias da formação de multidões e comportamento foram bastante influenciadas pela teoria da sociedade de massas. De acordo com esta teoria, os indivíduos são vistos compondo um mesmo corpo carecendo de forte coesão social e susceptíveis a manipulação. Essas multidões são, por isso, vistas como expressão dessas qualidades formando conglomerados amorfos e desenraizados de indivíduos. Nesta perspectiva, os tumultos como os da Terça-feira em Maputo e Xai-Xai, com largos números e grupos de indivíduos cometendo actos de violência, anti-social ou actos criminais, representam um resultado previsível da estrutura e comportamento de multidões. No entanto, contrariamente a perspectiva há pouco apresentada, estudos recentes, por exemplo sobre as claques dos clubes de futebol, mostram que tumultos são praticas altamente estruturadas e actividades de alguma maneira reguladas ou comandadas. Nesse sentido os danos causados podem até ser predefinidos. Está aqui um campo sociológico por explorar clinicamente na nossa sociedade. Precisamos, mais do que nunca, de uma sociologia clínica do tumulto ou da greve como quisermos. Para desenvolver esta sociologia temos começar a fazer outro tipo de perguntas e não a dar respostas apressadas.
Att:
Como diz o Ouri, e com razão, "a pressa é inimiga da perfeição". Como consegui roubar ao tempo alguns minutos fiz alterações, acréscimos e revisão ortográfica do texto.

[1] Esta referência pode ser encontrada aqui: Macamo, E. 2006. Um país cheio de soluções. Produções Lua: Colecção meianoite: Maputo.

Monday, February 11, 2008

O tempo da sociólogia: como é possível o tumulto?

Desde que ocorreram os tumultos de 5 de Fevereiro que não para de me incomodar a seguinte pergunta que acho simples na sua formulação: - Como é possível o tumulto (insurreição)? Esta pergunta têm um caracter eminentemente sociológico. É o mesmo tipo de perguntas que o sociólogo classíco alemão Georg Simmel se colocava sobre a possibilidade da própria sociadade: como é possível a sociedade? Simmel não foi o único. Ervirn Goffman outro nome incontornável da sociologia se questionava: como é possível o estigma? Como podereis notar a natureza destas perguntas não permitiu a aqueles dois sociólogos fazerem sociologia que age como a a polícia de intervenção rápida (PIR). Simmel como Goffman desenvolveram todo um projecto sociológico a partir destas e outras questões que lhes custou o tempo para fazerem carreira e estarmos hoje aqui a falar deles. Contribuiram com conhecimento novo para a sociedade. O Tempo de simmel e Goffman difere do tempo daqueles que se colocam outro tipo de perguntas, as perguntas retóricas.

As perguntas como as de Simmel e Goffman referem-se as condições sociais, sociológicas se quisermos, de possibilidade de ocorrência de um fenómeno social. No caso de 5 de Fevereiro seria dos tumultos. Como é possível o tumulto? As perguntas que até agora pude lêr de alguns dos nossos renomados sociológos parecem mais respostas que perguntas. Sim. Só há resposta para pergunta, mas também há perguntas retóricas para respostas já formuladas. Já se sabia a resposta quando se perguntou: - “o que aconteceu no dia 5 de Fevereiro”? Resposta: O povo se revoltou. O povo se cansou. O povo esgotou a paciência. Os moradores dos bairros suburbanos que sofrem todos dias para apanhar o chapa cansaram das artimanhas do governo etc. Já se sabia a resposta quando se perguntou:- quem é o culpado pelo que ocorreu no dia 5 de Fevereiro. Resposta: Claro, que é o governo, porque anda em carros de luxo, seus filhos não apanham chapa, são corruptos, e tudo quanto imaginação fertíl consegue produzir. A sociologia das respostas (que age como a P.I.R) danos estas respostas. E já tem a receita para o problema. Uma carta ao presidente para lhe dizer precisamente aquilo que ele já sabe, menos tudo aquilo que não sabe. - Senhor presidente faça alguma coisa! Sim. Concordo que escrever ao presidente é uma acto de exercício de cidadania. Não sabia é que académicos são – Hermes - porta vozes. O Elo de ligação entre o povo e o governo. E se forem, quem lhes delega essa função? Com que legitimidade? Quem lhes chama a responsabilidade caso o trabalho hermenéutico seja imperfeito? Essa è uma abordagem possível, mas bastante problemática da academia. Insisto nisto porque os meus alunos também visitam este espaço.

Voltemos aos tumultos. Já houve, continuam a existir e existirão tumultos em várias partes do mundo. As causas porém não são tão transparentes como ocorrem para alguns, muito menos transferiveis para se que possam aplicar em contextos diferentes. A receita de Paris pode não servir em Maputo. Houve também várias tentativas de estudar o fenómeno noutros contextos. Um sociólogo precavido podia até começar por aí, mas nunca ficar por aí. O que sabemos dos tumultos, até agora, é o que já sabiamos ou supomos que sabemos. Pensamos que sabemos que a causa dos tumultos é a zanga. Mais aí está, temos que entender a causa da zanga. Quando é que o povo se zanga? Sempre que o povo se zanga faz tumultos? Qual é o ponto de ebolição? Muitos vão achar que isto è uma bricandeira as perguntas. Que seja, mas não se esqueçam de reler o meu título: o tempo da sociologia! Deixemos a zanga. Achamos que sabemos que a causa da zanga é a pobreza abslotuta, que faz com que o pacato cidadão não consiga suportar o aumento do preço pão e do combustivél que como uma bola de neve faz subir o resto. Achamos que a zanga se deve a inacção do governo porque não liga patavinas o povo. Achamos tudo aquilo que a sociologia das respostas reportou desde o dia 5 em “Breaking news”. Sim. Essas são as respostas. São? Sim. São. São porque têm algum quê de verdade nelas, mas evidentemente uma verdade parcial. E pelo vistos bastente incompleta. São repostas que pecam pelo excesso de racionalização do fenómeno. O problema da racionalização é tomar o que deve ser explicado por explicação. Quer dizer, faz da pergunta a resposta. E mais, são respostas totais. Nelas cabe tudo. Para quem como eu não se conforma com respostas totais, algo continua a incomodar. Por exemplo. desde que eu me conheço como gente que as condições dos Moçambicanos são mais ou menos essas descritas pelas respostas sobre as razões da zanga. No entanto, a zanga é episódica. Ou melhor a zanga que provoca o tumulto é episódica. O que faz atingir o ponto de ebolição num período e não no outro? As condições sociais dos deserdados que os predispõe a zangar e tumultuar existem, como disse, há bastante tempo e afinal explicam-nos muito pouco. Aqui nem estou ainda a falar daquelas situações em que os tumultos ocorrem em contextos em que estas condições descritas no nosso caso não se encontram. E aí é que a porca torce o rabo. O que explica o tumulto? Podia continuar com a lista de aspectos cruciais que põem por terra - sem muito excercício de reflexão- as respostas totalitárias da sociologia rápida. As respostas racionalizantes dizem, por exemplo, que são os deserdados que se manifestaram. Como se os deserdados fossem um grupo homogêneo nos seus interesses e acção. Como è que se vê isso? Dizem as respostas: partiram montras, queimaram carros, fizeram barricadas. Afinal, perguntava-me alguém, o que é que fariam as pessoas senão isso mesmo? Quando se fazem tumultos na Suécia, que eu saiba, a reação é a mesma. Este exemplo è para sugeir que um aglomerado de pessoas não é um tumulto incipiente simplesmente por ser uma assembleia de pessoas com caracteristicas demograficas que os predispõe a agir de certo modo. Enquanto continuarmos impacientes para o tempo da sociologia teremos sempre as mesmas respostas para as perguntas retóricas que sempre tivemos. Os mais iluminados vão embalar essas respostas antigas com expressões rebuscadas e dar impressão de que se trata de um conhecimento novo. Na verdade é senso-comum erutido. A única coisa que acontece é que esse senso-comum erudito, portanto, problemático aparece agora metaforicamente associado a fenómenos naturais reproduzido e legtimado por Jornalistas incautos. A verdade é que ainda não sabermos como è possível o tumulto? Para ser mais concreto como foi possível o tumulto de 5 de Fevereiro de 2008. Está aí uma pergunta de partida!

























Decisões difíceis (4C)

Concluo hoje a publicação da série de textos sobre “Decisões Dificeis” de Elisio Macamo. O último texto reflete brevemente sobre o lado sociológico dos “tumultos” que ocorreram em Maputo e Xai-Xai na semana passada.

O lado sociológico

Os recentes tumultos em Maputo e em Xai-Xai em torno do aumento das tarifas de transporte levantam sérios problemas de natureza política, mas também do pelouro da sociologia. No primeiro caso, estamos perante a necessidade de discutirmos a responsabilidade do Estado, um debate ao qual sempre conseguimos fugir desde que ficamos independentes. Sendo assim, ficamos reféns de expectativas que dificilmente o nosso Estado pode realmente satisfazer ao mesmo tempo que a nossa classe política, literalmente, se engasga. No segundo caso, nomeadamente no que diz respeito à sociologia, estamos perante o desafio de elaborar uma sociologia política capaz de descrever e analisar as relações de dominação que caracterizam a nossa sociedade para entendermos a substância da autoridade e legitimidade.
Esta sociologia faz muita falta. Manifestações ocorrem em todo o lado. Manifestações violentas também. Até aqui o que aconteceu nos últimos dias entre nós não constitui nenhuma excepção. Todavia, constitui excepção o desfecho que a coisa vai ter. O desfecho, na verdade, não vai atacar o problema de base que está na origem desta e de outras manifestações que vão de certeza ocorrer nos próximos tempos: a relação entre o Estado e a sociedade. Política não consiste apenas em realizar eleições e garantir a liberdade de expressão. Política consiste também em definir o quadro dentro do qual os indivíduos e grupos podem articular os seus interesses de uma maneira que não comprometa a viabilidade do sistema político. A indústria do desenvolvimento e alguns sectores da nossa sociedade têm a tendência de promover a ideia de que o desenvolvimento significa acabar com a conflitualidade. Esta ideia é problemática e é capaz de estar na origem de algumas dificuldades que temos em estruturar o nosso campo político. Com o desenvolvimento os conflitos não acabam. Podem acabar os velhos conflitos, mas novos surgem, pois o desenvolvimento ele próprio produz tensões, colisão de interesses e divergências.
O que aumenta com o desenvolvimento é a capacidade de resolver os conflitos que vão surgindo. Sendo assim, penso que esta problemática do transporte nos mostra aquilo que ainda não sabemos muito bem em relação à nossa própria sociedade. Que noções de autoridade e legitimidade predominam entre nós? Quem são os indivíduos e grupos que determinam e são portadores dessas noções? Como é que elas se articulam com a definição de um espaço público de afirmação de interesses e de expressão individual e colectiva? Que factores concorrem para que um assunto seja de interesse público? Que características é que esse assunto possui? Como é que de preocupações individuais surgem preocupações colectivas? Que outras instâncias, para além da autoridade estatal, existem para a manifestação de autoridade e legitimidade?
Estas são algumas das questões que podemos colocar para começarmos a entender o que se passa à nossa volta. As imagens dos tumultos são dramáticas. Não obstante, o pior que poderíamos fazer agora era correr para conclusões na ausência deste conhecimento mais profundo. Os políticos precisam de agir já. Nós os académicos devemos tomar o tempo necessário para entendermos o que está em questão. É pouco e fútil para muitos de nós, mas é a única maneira responsável de não deitar mais combustível no fogo com análises apressadas.

Friday, February 8, 2008

Decisões difíceis (4B)

O lado moral da questão

Impostos são o grande motor da história. Reinos, impérios, regimes e sistemas erigiram-se, mantiveram-se e caíram graças a, ou por culpa de impostos. O imposto foi sempre uma manifestação de poder. É por isso que se chama imposto. De livre vontade ninguém ia contribuir para o bem-estar colectivo. Curiosamente, apesar de imposto o imposto está, parcialmente, na origem de formas representativas de governo. É só ver o caso americano. A que se deveu a guerra de independência? Aos impostos! Foi porque os colonos diziam que não podiam pagar impostos sem o direito de representação (no tax without representation) que eles se insurgiram contra a corôa britânica. Isto é, o poder que exige o pagamento de um imposto compromete-se com o contribuinte. Se não quer ficar arbitrário, despótico e rapinoso tem que dar ao contribuinte alguma coisa em troca. O imposto é o princípio essencial da democracia representativa, creio.
Mas o assunto é complicado e tem estado na base de toda uma discussão filosófica sem fim. Há quem ache que imposto é roubo oficial. No fundo, até porque é. Sempre foi. É só pensar em toda a história europeia. A aristocracia sempre exigiu pagamento de todo o tipo de impostos para satisfazer os seus caprichos. Há famílias aristocráticas na Europa que enriqueceram à custa, por exemplo, da venda de seus próprios súbditos para exércitos estrangeiros. Muitos dos que andaram pelas guerras coloniais nas nossas Áfricas não eram servidores leais das suas nações. Eram obrigações fiscais que enchiam os bolsos dos seus “donos”. Não admira a ideia de Marx e Engels de acabar com a propriedade privada para acabar com todos os impostos. Ao proporem isto no seu Manifesto Comunista juntamente com a ideia de Proudhon de que propriedade era roubalheira, eles estavam a reagir a uma experiência bastante negativa do imposto. Estranhamente, hoje são os círculos mais à direita do espectro político que exigem a eliminação de impostos.

Muitos apoiam-se em Adam Smith para exigir o não pagamento de impostos. Fazem recurso à sua ideia da mão invísivel do mercado para dizer que só o mercado é que pode corrigir desequilíbrios na distribuição de riqueza e oportunidades. Esquecem-se de um pormenor muito interessante. Para além de filósofo, Adam Smith era funcionário do serviço de impostos! Ele sabia da importância do imposto. Tanto sabia ele que até chegou a propor quatro critérios que deviam orientar a cobrança de impostos: (1) comportável, isto é as pessoas deviam ser capazes de o pagar (1 Metical por dia dá para pagar); (2) previsível, isto é que não dependa do humor dos detentores do poder; (3) razoável, isto é que não seja para punir pessoas pelo que fazem (neste caso o imposto de mobilidade seria um problema...); e, finalmente, (4) um imposto não devia ser complicado; o que Adam Smith tinha em mente aqui era a ideia de que um indivíduo não devia precisar de um assessor de impostos para saber como pagar o imposto; no nosso caso, a complicação deve ter em mente diminuir as oportunidades que algumas pessoas teriam de “viver” da cobrança, vulgo “corrupção”.
A nossa questão é de saber o que justifica a cobrança de impostos e se importa que essa coisa tenha alguma relação com o que é tributado. Não sei. Por mim, se os princípios que sustentam o Estado assentam na ideia de que é responsabilidade desse Estado criar condições para que cada um de nós resolva os seus problemas, não vejo porque o Estado não poderia arranjar seja qual fosse o motivo para cobrar os impostos que lhe vão permitir fazer isso. Será este um caso dos fins que justificam os meios? Não sei? Será que não importariam as injustiças cometidas contra certos grupos no interior da sociedade? Não sei. Podia-se, em princípio, cobrar imposto de beleza, elegância, lazer, ar, água, mobilidade, preguiça, etc. O que importa, num primeiro momento, é ter receitas para o Estado. Num segundo momento importaria, naturalmente, ter de discutir o uso que se faz dessas receitas. O mais importante parece-me ser a possibilidade que o pagamento de imposto nos oferece de tornar a acção do Estado nosso assunto. Quem paga imposto está a comprar o direito de participação nos assuntos públicos. É uma das formas mais potentes de “empowerment”, julgo. E, se calhar, o nosso problema em Moçambique é que somos poucos a pagar impostos, fora o IVA que penaliza os pobres sem lhes dar direitos de participação.

Thursday, February 7, 2008

Decisões difíceis (4A)

Começo hoje a publicar uma série de três artigos do sociólogo Elísio Macamo. Trata-se de artigos que Macamo vinha publicando no seu blog sobre o título “Decisões dífíceis”. Os artigos poderão ser intercalados por outros de minha autoria caso consiga vagar para tal.
Obrigações voluntárias

Sei que esta expressão é impossível. É uma contradição. Estou, contudo, à procura de uma maneira de fugir à honestidade de governos quando falam de “impostos”. É engraçado que nunca me dei conta disto. Imposto é algo imposto. Nunca nenhum governo se sentiu tentado a arranjar um eufemismo para isto. Nunca nenhum governo disse, por exemplo, “obrigações voluntárias”, tipo Frelimo gloriosa quando falava do “trabalho voluntário” ... que era obrigatório.
Hoje quero abordar um outro tipo de decisão moral difícil: os impostos. A sua história é imemorial. Onde se exerce poder, pagam-se impostos. As formas variam, os objectivos não têm limites, a resistência é sempre grande. Mas, pagar imposto na vida é tão certo quanto nascer e morrer. É incontornável. Pensei neste assunto por causa da actual discussão em Moçambique em torno do preço dos combustíveis. É evidente que temos um problema sério de transportes no nosso país. Para além da falta de imaginação que caracteriza esse problema que temos, há também a questão da falta de recursos financeiros para agirmos como Estado. As estradas estão em más condições, o que causa acidentes; paga-se pouco à polícia de trânsito, o que a torna menos eficiente e menos comprometida com o Estado. Enfim, muitos problemas que vão dar num círculo vicioso de onde é difícil sairmos.
Quero, então, fazer uma proposta de solução. Já que o problema é a falta de recursos financeiros da parte do Estado porque não o dotar desses recursos? Como, é a pergunta que estão todos a colocar. Bom, através de impostos! Sempre foi assim na história da humanidade. Os meus avôs davam um pouco da sua colheita ao régulo, os meus pais pagavam o imposto de palhota ao governo colonial e eu, quando comecei a trabalhar em 1984, recebi quatro barra oitenta e pagava o imposto de solidariedade. A minha proposta é simples. O governo podia criar um imposto de mobilidade nos centros urbanos. Em Maputo, por exemplo, todo o citadino devia pagar por dia 1 Metical de imposto de mobilidade. Para os que se movimentam em veículos motorizados podia-se acrescentar uma taxa de 50 centavos e aqueles que o fazem várias vezes ao dia acrescentava-se mais 50 centavos. Vamos fazer as contas. Quantos habitantes tem Maputo? Cerca de dois milhões? São dois milhões de Meticais por dia. Numa semana? Catorze milhões. Num mês? Cinquenta e seis milhões de Meticais! E não estou a incluir as taxas extras. Parece-me boa mola, para começar.
Para evitar corrupção o governo podia sub-contractar o negócio a uma empresa privada de segurança. A empresa teria a prerrogativa de exigir o pagamento a todo o citadino e quem recusasse – ou não pudesse – apanhava chambocada em praça pública. O imposto de mobilidade seria o preço de viver em Maputo. Ah, já agora, famílias com mais do que uma viatura deviam pagar taxas acrescidas. Mais 50 centavos por viatura. Famílias a viver longe do centro da cidade, mas sem viatura e a trabalharem no centro da cidade, deviam também pagar uma taxa adicional de 50 centavos para serem penalizadas justamente por isso. Se não tem carro, fica onde está! Já agora, todo o Ministro e todo o Secretário Geral de um Ministério e todos os deputados da Assembleia da República deviam ter a obrigação de andar com escolta e sirene. Cobrar-se-ia uma taxa de poluição sonora, mobilidade colectiva e ares de importância de um valor fixo de 1 milhão de Meticais. É o preço de ser importante! A punição, no caso de não cumprimento, devia ser a obrigação de viajar em classe económica nos aviões.
A minha pergunta é a seguinte: a justificação de um imposto está na coisa tributada ou nos fins que o Estado pretende alcançar?

Tuesday, February 5, 2008

Conferência sobre liberdade académica e reforma do ensino superior em Africa!

Apelo a participação

Caros leitores, amigos e colegas. Este anúncio responde a uma solicitação que me foi feita pelo CODESRIA para divulgar esta informação principalmente para os colegas académicos moçambicanos. Voz sabeis o quão ausentes temos estado dos fóruns de debate académico regional e internacional sobre os mais diversos assuntos. Quando numa conferência Internacional ou num congresso internacional (por exemplo 16th Congresso internacional de Sociologia, que aconteceu na nossa barba, em Durban 2006) só aparece um ou dois Moçambicanos é sinal de que algo não vai bem na nossa academia. Se consideramos o número cada vez crescente de intitulados sociólogos é ainda mais inaceitável a sua ausência desses fóruns. Espero que não estejamos ocupados a Combater a Pobreza Absoluta!
Já agora permitam-me apresentar-vos a hipótese da minha comunicação para a conferência em Rabat:

O(s) Combate(tentes) (d)a Pobreza ABSOLUTA em Moçambique (são) é, hoje, o maior inimigo da Liberdade Académica”!



Infezlimente, não poderei traduzir o anuncio para Português( será isso que nos impede de participar?).

International Conference
Academic Freedom and Higher Education Reforms in North Africa
Rabat, 27- 28 March 2008
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The Council for the Development of Social Science Research in Africa (CODESRIA) and the Institute for African Studies of the Mohammed V-Souissi University are pleased to announce the organisation of an international conference on Academic Freedom and Higher Education Reforms in North Africa in Rabat, Morocco, from 27-28 March 2008.

This conference, aimed at strengthening one of the main missions of the Council -- the promotion of freedom of thought and of research in African universities, is organised within the framework of the CODESRIA Academic Freedom Programme. The meeting is part of a series of debates started by CODESRIA in 2007 on ongoing reforms in African universities and the impact of these reforms on academic freedom. More concretely, the conference is a follow up on an earlier conference on Academic Freedom in African and Arab Countries: Problems and Challenges, which was jointly organised by the Scientific Committee of the UNESCO Regional Forum for Arab countries, the Arab-African Research Centre, the Swedish Institute in Alexandria, and CODESRIA, and which held in Alexandria, Egypt, from 10-11 September 2005.

In the last three decades, issues of freedom of expression and academic freedom, as well as human rights have been at the centre of social and political struggles in North African countries. This region, which boasts some of the oldest universities (Al Azhar in Egypt, Al Karaouine in Tunisia and Morocco) and some of the oldest political systems in the world, has is testimony of a long and complex relationship between knowledge producers on one hand and wielders of political power on the other. The modernisation of these societies, as well as their integration in the globalisation process, come with a consciousness amongst the younger generation on issues of civil, political and cultural rights, especially universal access to quality scientific teachings, the rights of women to participate on the same level as men in the social and economic development of their country, as well as the right to information at all levels. This consciousness translated into extremely complex struggles and has not left researchers and academics behind, underscoring the strong link between the quest for civic rights and the struggle for academic freedom. The notion of academic freedom enables academics the right to enjoy all forms of freedom of expression within and outside institutions of higher education, as well as the freedom of dissemination of results of academic research.

Particular attention will be paid to the relationships between State, civil society, political players, military and economic powers. To better understand the collaboration and confrontation between State and Intellectuals, the participants are invited to seek to clarify the complex relationships that exist between the State, civil society and intellectuals. The various political contexts experienced by these societies, the period of one-party state and of so-called democratic reforms in particular, and their impact on academic freedom will also be discussed. Is there a difference between the way monarchies and other political systems have impacted on academic freedom? How to understand “direct democracies” in relation to the challenges posed by academic freedom? Equally of interest will be the relationship between religious movements and freedom of expression. To what extent is it true to claim that religion has always been the dominant ideology in North African states, and the main political legitimization and social mobilisation tool? Otherwise, what has been the role of religion in limiting or promoting academic freedom? Have we gone past the “conservative revolution” of Algeria in the beginning of the 1990s, which in the name of religious values, demanded not freedom or freedoms, but the power to institutionalise and normalize the right to forbid? At what costs was the Islamist wave that wanted to silence intellectuals as bearers of “sense” as active representatives of another cultural hegemony, opposite to that of Islamists of yesteryears overcome in that country in the beginning of the 1990s?

Looking back at the struggle for these freedoms, the conference will undertake a critical assessment of academics in relation to these struggles. Since the Kampala declaration that took place in a context of trampled liberties, and that, among others, dwelled on the social responsibility of researchers and academics, a long way has been travelled. The freedom of expression and of association has become reality in many African countries, including North African countries. However, important challenges still exist. We could ask what has become of these hard earned freedoms? What new challenges face intellectuals in North Africa with the rise of terrorism?

The envisaged debate on academic freedom will not be limited to its political dimension. The conference will be the occasion to revisit the thorny issue of the universalisation of Arab universities against the arabisation and africanisation of curricula. In the last two decades, African universities in general and universities in North Africa in particular have undergone influences and trends that have affected the practices and norms of academic freedom. Globalisation has brought opportunities for academic freedom, particularly in terms of knowledge production, research and teaching possibilities. But it poses a certain number of constraints and of challenges that less developed countries must face. The issue of the impact of western values, often considered as universal, on academic freedom, must have the place it deserves in the debates, as well as the question of the weight or hegemony, of the neo-liberalism in the search for solutions to the problems of higher education.

The objective of the conference is the strengthening of capacity in higher education in Africa towards quality training and research, for the production of knowledge and techniques necessary for the development and well being of African populations. This is only possible with concertation amongst the various actors working in the higher education sector (lecturers, governments, civil society and international partners) and promotion of a frank and open dialogue that will contribute to the transformation of the situation.

It is noteworthy that in the past few years, there is growing interest on the part of national and international decision makers in issues of higher education reform in Africa, stemming from the computer revolution and the global mutation towards an information society where knowledge has taken, nowadays, the place of capital as source of wealth for the present and for the future.

To face the challenge of the acceleration of knowledge production, Morocco has undertaken, since 2002, a series of national initiatives for human development whose first objective is to integrate Moroccans in the new world order. The reform of higher education introduced in 2002-2003, is part of these initiatives. It is based on a national charter of education and training that defines the rights and obligation of the various partners in this endeavour – the lecturers, the students, the State and civil society. At the heart of this reform, there is the issue of human rights as defined by international conventions and declarations signed by Morocco, and that comprise “academic freedom”, “institutional autonomy” and “social responsibility”.

From the Moroccan experience in human rights and in higher education reforms and taking into account experiences of other countries in this regard, CODESRIA and the Institute of African Studies invite experts and decision makers in higher education as well as Moroccan and other human rights advocates to reflect in a comparative perspective on the following points:

Concepts of “academic freedom”, “institutional autonomy” and of “social responsibility” in the frameworks of reforms in higher education in Africa;
History and the present state of African higher education in general, in North Africa and in Morocco in particular
Contexts – national, regional and global – of higher education reform in North Africa, the implications on the democratisation process and to what extent the present reform has consolidated academic freedom, developed capacity in knowledge production and contributed to the promotion of social progress in North Africa
Strategies for the strengthening of academic freedom and social responsibility in North African contexts
Development of private universities and the privatisation of certain services in institutions of higher education and their impact on academic freedom
Impact of the universalisation of higher education reform in North African countries on academic freedom
Social actors in the struggle for academic freedom
Autonomy of university and the State

The abstracts of contributions must reach the email of the CODESRIA Secretariat on 10 February 2008, latest. The abstracts must not exceed one page (font: Times New Roman, font size: 12, single space) and must contain the title, the contacts, affiliation and biography of the applicant. The results of the selection committee will be made public on 25 February 2008, latest. The final contributions selected must be sent by email to the secretariat in a time frame of two weeks. The languages used during the conference are French, English and Arabic. The participation expenses of selected participants and identified contributors will be paid for by CODESRIA.

All applications must be sent to the address below:

Conference on Academic Freedom in North Africa
CODESRIA
Avenue Cheikh Anta Diop x Canal IV
P.O. Box 3304 Dakar, Senegal
Email: academic.freedom@codesria.sn
Site Web: http//www.codesria.org