Postura téorica.
“Foi com as minhas mais queridas impressões ESTÉTICAS que eu quis lutar aqui, tentando impelir até aos seus últimos e mais cruéis limites a sinceridade intelectual”. Marcel Proust, in Ar Regras da Arte, Bourdieu, (1996).
Quando escrevi que “De Gustibus non est disputandum”, em Português, gosto não se discute, na verdade a minha intenção era o contrário sugerir. Gosto discute-se, sim. Foi por isso que sugeri, antes, aos meus caros leitores a leitura de um texto que contém alguns elementos da teoria de Bourdieu sobre a dimensão social do gosto. O gosto não é algo natural ou inato, e por isso, indiscutível. O gosto é defensável como algo socialmente construído e condicionado. Os que estão fartos deste discurso construtivista já devem estar a dizer: lá vem este tipo de novo com a história de que as coisas não existem, ou que são produto da imaginação que delas fazemos, assim como fez no debate sobre o desflorestameto/desmatamento. Desta vez vou tentar poupá-los do meu construtivismo, talvez, ingénuo. Mas como ainda pesam muito em mim as categorias analíticas deste modo de pensar, não terei como a isso escapar.
As categorias de percepção e apreciação estética não são inatas aos indivíduos, são sim adquiridas. Pelo menos assim sugere o autor de quem me tenho socorrido. Em A distinção: critica social do julgamento do gosto [minha tradução], título da obra que reproduz a pesquisa empírica do sociólogo Francês sobre o gosto, essa posição é defendida. A pesquisa iniciou em 1963 e prolongou-se até a conclusão em 1967/68. Em 1979 fez-se a primeira publicação do livro na França. Alguns anos após a publicação original começaram as traduções para outras línguas. Para o Inglês foi Richard Nice, um dos maiores tradutores das obras de Bourdieu nos EUA, a fazê-lo em 1984. Em 1998 a obra foi considerada uma das dez mais importantes produções sociológicas do século XX. Nesse livro volumoso, Bourdieu discute como aqueles que se encontram em posição de poder definem os conceitos estéticos tais como o de “gosto”. A partir da sua pesquisa o sociólogo tenta demonstrar como as classes sociais tendem a determinar os “gostos” e interesses dos indivíduos, e como as distinções baseadas nas classes sociais são reforçadas no dia-a-dia.
Bourdieu nota que mesmo quando as classes subordinadas pareçam ter sua própria ideia do “bom gosto”, nunca deve ser esquecido que a estética das classes trabalhadoras é uma estética dominada que é constantemente obrigada a definir-se em termos da estética dominante. Enfim, tudo isto vem a propósito das ideias que tenho defendido em relação ao que considero de posicionamentos conservadores com algum essencialismo ingénuo que algumas pessoas têm da música e da identidade da música moçambicana. O que quero dizer hoje é que acima de um posicionamento teórico, o que me leva a emprestar um certo construtivismo no meu olhar é também uma questão de “gosto de classe”, enquanto socialmente determinado. A minha maneira de olhar para as coisas é refém, ainda que seja consciente disso, do(s) lugare(s) sociais que vou ocupando na estrutura social da nossa sociedade. Fá-lo de algum lugar que não é neutro, nem isento, apesar desses valores serem um desiderato ideal a alcançar. Disputo di-visões do mundo social com os meus interlocutores que também falam de algum lugar. Cada um de nós, provavelmente, reclamando ter melhor acesso descritivo da realidade. Enfim, a seguir quero tentar reflectir alto sobre as possíveis razões que determinam o meu gosto pela música e o estilo artístico de Salimo Muhamed. A pergunta, penso que é simples, que me coloquei é porque gosto da música de Salimo? Será que gosto mesmo? O que me faz achar que gosto? Este breve acto reflexivo está a levar-me a necessidade de perguntar, afinal, o que é gostar? Instantaneamente, ocorreu-me o dicionário que me forneceu três significados e/ou sinónimo para a palavra gostar: afeição por, simpatizar e adorar. Pelo sugerido, gostar é fazer uma destas ou as três coisas em simultâneo. Ocorre que os três vocábulos parecem remeter-nos para o campo do sentimental. Poderíamos fazer o mesmo exercício e perguntar se o sentimento é natural ou socialmente produzido e/ou condicionado. Mas fiquemos por aqui. No próximo texto vou falar sobre o meu sentimento em relação a música de Salimo Muhamed.
“Foi com as minhas mais queridas impressões ESTÉTICAS que eu quis lutar aqui, tentando impelir até aos seus últimos e mais cruéis limites a sinceridade intelectual”. Marcel Proust, in Ar Regras da Arte, Bourdieu, (1996).
Quando escrevi que “De Gustibus non est disputandum”, em Português, gosto não se discute, na verdade a minha intenção era o contrário sugerir. Gosto discute-se, sim. Foi por isso que sugeri, antes, aos meus caros leitores a leitura de um texto que contém alguns elementos da teoria de Bourdieu sobre a dimensão social do gosto. O gosto não é algo natural ou inato, e por isso, indiscutível. O gosto é defensável como algo socialmente construído e condicionado. Os que estão fartos deste discurso construtivista já devem estar a dizer: lá vem este tipo de novo com a história de que as coisas não existem, ou que são produto da imaginação que delas fazemos, assim como fez no debate sobre o desflorestameto/desmatamento. Desta vez vou tentar poupá-los do meu construtivismo, talvez, ingénuo. Mas como ainda pesam muito em mim as categorias analíticas deste modo de pensar, não terei como a isso escapar.
As categorias de percepção e apreciação estética não são inatas aos indivíduos, são sim adquiridas. Pelo menos assim sugere o autor de quem me tenho socorrido. Em A distinção: critica social do julgamento do gosto [minha tradução], título da obra que reproduz a pesquisa empírica do sociólogo Francês sobre o gosto, essa posição é defendida. A pesquisa iniciou em 1963 e prolongou-se até a conclusão em 1967/68. Em 1979 fez-se a primeira publicação do livro na França. Alguns anos após a publicação original começaram as traduções para outras línguas. Para o Inglês foi Richard Nice, um dos maiores tradutores das obras de Bourdieu nos EUA, a fazê-lo em 1984. Em 1998 a obra foi considerada uma das dez mais importantes produções sociológicas do século XX. Nesse livro volumoso, Bourdieu discute como aqueles que se encontram em posição de poder definem os conceitos estéticos tais como o de “gosto”. A partir da sua pesquisa o sociólogo tenta demonstrar como as classes sociais tendem a determinar os “gostos” e interesses dos indivíduos, e como as distinções baseadas nas classes sociais são reforçadas no dia-a-dia.
Bourdieu nota que mesmo quando as classes subordinadas pareçam ter sua própria ideia do “bom gosto”, nunca deve ser esquecido que a estética das classes trabalhadoras é uma estética dominada que é constantemente obrigada a definir-se em termos da estética dominante. Enfim, tudo isto vem a propósito das ideias que tenho defendido em relação ao que considero de posicionamentos conservadores com algum essencialismo ingénuo que algumas pessoas têm da música e da identidade da música moçambicana. O que quero dizer hoje é que acima de um posicionamento teórico, o que me leva a emprestar um certo construtivismo no meu olhar é também uma questão de “gosto de classe”, enquanto socialmente determinado. A minha maneira de olhar para as coisas é refém, ainda que seja consciente disso, do(s) lugare(s) sociais que vou ocupando na estrutura social da nossa sociedade. Fá-lo de algum lugar que não é neutro, nem isento, apesar desses valores serem um desiderato ideal a alcançar. Disputo di-visões do mundo social com os meus interlocutores que também falam de algum lugar. Cada um de nós, provavelmente, reclamando ter melhor acesso descritivo da realidade. Enfim, a seguir quero tentar reflectir alto sobre as possíveis razões que determinam o meu gosto pela música e o estilo artístico de Salimo Muhamed. A pergunta, penso que é simples, que me coloquei é porque gosto da música de Salimo? Será que gosto mesmo? O que me faz achar que gosto? Este breve acto reflexivo está a levar-me a necessidade de perguntar, afinal, o que é gostar? Instantaneamente, ocorreu-me o dicionário que me forneceu três significados e/ou sinónimo para a palavra gostar: afeição por, simpatizar e adorar. Pelo sugerido, gostar é fazer uma destas ou as três coisas em simultâneo. Ocorre que os três vocábulos parecem remeter-nos para o campo do sentimental. Poderíamos fazer o mesmo exercício e perguntar se o sentimento é natural ou socialmente produzido e/ou condicionado. Mas fiquemos por aqui. No próximo texto vou falar sobre o meu sentimento em relação a música de Salimo Muhamed.
No comments:
Post a Comment