Thursday, November 29, 2007

Não queria viver “bem” por medo de feitiçaria!?

Esta estória parace-me mais fantasia do jornalista do que relato de factos e experiência real do principal personagem! O que acham vocês?
Governo “obrigou-me” a construir e comer bem - Sumbane Wamutsotso, criador de gado no distrito de Chigubo, em entrevista ao "Notícias"

ESTÁ a construir sua residência tipo três a escassos metros das instalações da sede distrital. As suas cinco esposas estão a aprender como preparar alimentos nutritivos, de modo que no regime alimentar da sua família não faltem alimentos protectores do organismo. Em entrevista ao nosso jornal, Alberto Sumbane Wamutsotso, grande criador de gado no distrito de Chigubo, província de Gaza, disse que não tinha o hábito de viver bem, "não porque não gosta, mas sim por medo de feitiço". Apesar disso, Wamutsotso já havia se preparado para ir à capital do país comprar um carro, Land Cruiser , "novinho em folha". O sonho só não se realizou porque o ex-governador de Gaza, Djalma Lourenço e o administrador distrital Alves Zitha, acoselharam-no que no lugar de comprar um carro, devia construir uma casa condigna para si e família.
Maputo, Quinta-Feira, 29 de Novembro de 2007:: Notícias

Alberto Wamutsotso é um dos maiores criadores de gado bovino e caprino no distrito de Chigubo, província de Gaza, mas diz que não vive bem porque teme feitiçaria. "Se não vivo como um branco é porque tenho medo dos feiticeiros, tenho tudo para viver bem", disse.
Com cerca de mil cabeças de gado, o velho Wamutsotso como é carinhosamente tratado em Dindiza, vila-sede distrital, diz ter muito dinheiro e viatura própria, ainda com matrícula estrangeira. Em contrapartida, vive numa palhota. Segundo fontes da administração local, só agora é que está a seguir um regime alimentar equilibrado.
Em entrevista ao "Notícias", Wamutsotso disse que o medo de alegados feiticeiros está a passar aos poucos porque teve encorajamento dos governantes do distrito e da província. Conta que o ex-governador Djalma Lourenço e o administrador de Chigubo, Alves Zitha, o ajudaram bastante.
“Djalma e Zitha obrigaram-me a iniciar as obras, pois eu e minhas cinco esposas e 22 filhos, sempre vivemos nestas palhotas. Os chefes disseram-me que uma pessoa como eu, com as condições materiais que eu tenho, não devia viver assim. Foi difícil decidir porque antes queria comprar um Land Cruiser, é o carro dos meus sonhos”, contou.
Wamutsotso, que é membro do Conselho Consultivo Distrital, disse que nos princípios, quando era pressionado para melhorar a vida, se sentia incomodado, porque já estava habituado a viver naquelas condições. “É que se a pessoa fizer algo melhor, os feiticeiros começam a persegui-lo”, lamentou.
O nosso interlocutor levou-nos à sua casa e mostrou a obra que está a florescer. “Estou muito satisfeito, vou convidá-lo para vir ver a minha casa quando tiver terminado. Isso foi graças à pressão que o governador e administrador fizeram, até chegaram a dizer-me que se não construísse uma casa para a família, mandar-me-iam prender”.
Segundo nos contou, o Governo contactou um empreiteiro, para construir a casa. Porque Wamutsotso não queria mexer no dinheiro que tem, procurou saber junto do construtor, quantos bois precisaria para construir a vivenda, sem no entanto, gastar nenhum tostão. “Ele disse-me que precisava de muitas cabeças e eu disse lhe para avançar e dei-lhe os bois que queria”, explicou Wamutsotso.
"Também projectavam cobrir a casa com chapas de zinco, mas eu não as quero, prefiro betão. Perguntei ao empreiteiro quantos bois queria para cobrir com placa, e ele pediu mais cabeças de gado. Não hesitei, instrui-o a avançar” disse, acrescentando que há muita gente naquele distrito que possui muita riqueza mas não quer melhorar a sua vida por temer feitiçaria.

LAND CRUISER E TRACTOR
Maputo, Quinta-Feira, 29 de Novembro de 2007:: Notícias

O sonho de adquirir um Land Cruiser ainda não desapareceu. Por isso, o nosso entrevistado disse que custe o que custar assim que terminar a construção da casa vai avançar no seu projecto de aquisição de um carro todo-o-terreno e de um tractor para agricultura.

MEDO DE ALGUNS PAIS

O receio pela suposta feitiçaria no distrito é generalizado. Wamutsotso disse haver em Chigubo muitos criadores de gado, mas não fazem coisas boas por medo de invejosos que enfeitiçam qualquer pessoa que demonstre sinais de bem-estar.Afirmou também que parte dos habitantes deste distrito têm filhos altamente formados em Maputo e noutros cantos do país, uns até trabalhando nas minas da África do Sul. “Mas eles não podem construir e desenvolver este distrito porque têm medo de feitiçaria, os filhos querem fazer qualquer coisa, mas os pais têm-lhes dito que, se quiserem viver, não podem dar nas vistas que têm alguma riqueza”. Questionado sobre se ter uma casa de alvenaria é sinónimo de riqueza ele respondeu positivamente, tendo justificado que “os nossos pais, avós nunca tiveram tais bens, quando surge alguém a fazer isso todos os invejam”. Agora, como membro do Conselho Consultivo do Governo distrital, a nossa fonte diz estar a trabalhar por forma a mobilizar as pessoas a desenvolverem o distrito. “Tenho dito a eles que se todos tivermos alguma coisa, ninguém irá cobiçar o bem do outro e assim estaremos todos muito bem e o nosso distrito mais desenvolvido”.

A GUERRA RETROCEDEU-ME

Maputo, Quinta-Feira, 29 de Novembro de 2007:: Notícias

Durante a guerra de desestabilização, Sumbane Wamutsotso refugiou-se pna África do Sul, onde trabalhou durante 13 anos. Do lado de cá, em Moçambique, concretamente no distrito de Chigubo, haviam ficado muitas cabeças de gado bovino, caprino e aves. “Os bandidos mataram e carregaram muitas cabeças e queimaram as minhas casas, tive que recomeçar tudo e, agora, graças a Deus estou a andar”.
O distrito de Chigubo foi um dos corredores da Renamo, houve muitas confrontações entre tropas governamentais e do movimento de Afonso Dhlakama. “Se não tivesse havido guerra, nós aqui estaríamos a contar outra história, apesar deste distrito parecer pobre, somos ricos, porque trabalhamos muito. Mas o confronto armado matou muitas pessoas aqui no distrito e destruiu muitos bens. Se não fosse isso, Chigubo estaria num outro estágio de desenvolvimento” .Wamutsotso disse que a estiagem prolongada no distrito é o reflexo da guerra, “os espíritos dos defuntos vítimas da guerra até podem estar zangados, uns dizem que poderão estar por detrás destas secas. Aqui morreu-se. Desde muito houve seca, mas há algumas lagoas que não secavam. Porém, agora secam”, lamentou.

ÁGUA NÃO CHEGA PARA TODOS EM CHIGUBO
Maputo, Quinta-Feira, 29 de Novembro de 2007:: Notícias

A FALTA de água no distrito de Chigubo é um grande desafio para a população. As pessoas percorrem longas distâncias à procura deste precioso líquido, não só para o seu consumo, como também para garantir a dos seus animais. Quando se chega a uma fonte, a preocupação é também dar de beber aos animais, ainda que seja para molhar a garganta.
Wamutsotso disse que quando nasce o dia, a primeira preocupação é saber o que os seus animais vão beber e onde? “Somos muitos criadores. Os furos são poucos. A água não chega para todos”.
“É que a mudança da sede distrital de Saúte para Dindiza, veio aumentar o número de habitantes na zona. Com a indicação do Governo tivemos que nos reunir para discutir sobre a questão da água. É que ela tem que chegar para todos. Sem água não há vida. Tínhamos que encontrar formas de distribuí-la por todos. Foi a partir desta experiência que concluí que é no momento do sofrimento em que as pessoas se sentem mais unidas”, explicou, acrescentando que o Instituto Nacional de Gestão das Calamidades (INGC) reabilitou alguns furos de água na zona, mas continua a escassear. Sumbane Wamutsotso afirmou ainda que os grandes criadores tencionam contribuir para fazer um furo de água para minorar o sofrimento da população local.

TROCAR RELÓGIO POR CHIFRES

Maputo, Quinta-Feira, 29 de Novembro de 2007:: Notícias

O velho Sumbane Wamutsotso gostou de um relógio de pulso de Vitorino Mondlane, um técnico do INGC, que também visitava aquele distrito. O grande criador de gado interpelou ao jovem técnico para lhe dizer que gostou do seu relógio, acrescentando que teria visto um igual na África do Sul, no pulso de um boer. Disse ainda que gostaria de ter um igual.
Porque Mondlane não avançava qualquer proposta, apenas dizia que existe à venda em Maputo, Wamutsotso não hesitou em propor a troca do relógio por um par de chifres de boi.
Vitorino Mondlane ficou atónito, pensando que era uma cabeça de vaca em troca do relógio, mas quando quis se certificar, soube que se tratava de chifres, no verdadeiro sentido da palavra. “O boi já foi morto, levará apenas para Maputo um par de chifres”, disse Wamutsotso, expressando-se, calmamente, em changana.
Vitorino voltou a questionar, o que iria fazer com os chifres e a resposta não tardou: “meu filho, se tu levas este par de chifres para Maputo, toda gente vai te respeitar e as mulheres verão que você é homem, bastando pendurá-los numa árvore do seu quintal ou mesmo pregá-los na sua porta”.O dono do relógio riu-se e abanou a cabeça, em sinal de discordância: “trocar o meu relógio por um par de chifres?, não faltava mais nada...”, vociferou Mondlane. E o velho Wamutsotso perdeu assim a chance de ter o relógio idêntico ao do boer que vira na África do Sul.
RODRIGUES LUÍS

1 comment:

Anonymous said...

Oi Patrício! Olha, pelo que tenho observado na minha pesquisa de campo, é isso mesmo. O que esse senhor de Chigubo diz e argumenta é o senso comum dos discusos cotidianos que ouço em outro distrito, no interior da província de Inhambane. Enfim, ao que parece, feitiçaria é algo extremamente contemporâneo no Sul do país. Tem que levar a sério a importância desses argumentos para se compreender a vida social das áreas rurais. Não podem ser descartados como mero folclore e devem ser encarados como sociologicamente relevantes. Um grande abraço!