HÁ uma semana, a STV transmitiu uma notícia dando conta da iminente abertura de um curso superior de teatro na UEM. Não sei até onde a notícia corresponde à verdade, mesmo assim estou ciente do perigo de iniciar um curso com base numa notícia dada pelos media e ainda mais pela STV. Infelizmente, neste caso não interessa consultar à UEM porque a notícia basta e acho que vale a pena usá-la como pretexto para falar de teatro.
Maputo, Quarta-Feira, 7 de Novembro de 2007:: Notícias
Gosto de teatro, não qualquer manifestação que se chame teatro, mas teatro mesmo, por isso estive durante muito tempo entre o palco, bastidores e no grupo teatral da Escola Secundária Francisco Manyanga e na Associação Cultural da Casa Velha.
Mas quando se trata de um curso, sou da opinião de que todo o curso deveria ser um complemento de uma formação técnica ou básica. E não temos formação básica nesta área mas me parece que já se está a pensar em criar doutores em teatro, o que é absurdo, alguém tem que pôr freios na educação em Moçambique e de uma forma participativa repensarmos no ensino pois o país não vai desenvolver com doutores e muito menos através de professores doutores.
Os promotores deste curso deveriam considerar outras alternativas do que necessariamente um curso superior, e os modelos da Escola Nacional de Dança e o da Escola das Artes Visuais mesmo sendo duas realidades diferentes cada um com os seus problemas e desafios deviam ser tomadas em consideração. Um exemplo mais próximo seria a Faculdade de Arquitectura e Planeamento Físico que mesmo antes da sua criação primeiro surgiu um curso técnico de planeamento físico.
Sendo que a Escola Nacional de Dança e a Escola das Artes Visuais ligadas ao Ministério de Educação, esta entidade e outras interessadas na educação deveriam ser ouvidas de forma que a necessidade de cursar e formar o homem moçambicano para adquirir capacidade de criação, utilização e aplicação de saber em arte seja bem encaminhada.
O teatro pode ter um papel muito importante para o desenvolvimento, porque pode ser bem usado na comunicação de temáticas como HIV/SIDA, género, educação cívica, saúde, boa-governação, saneamento e sobretudo na educação. Desta forma, a intenção de criar um curso de teatro deveria incluir no currícuo questões de desenvolvimento e o combate à pobreza.
Voltando para o teatro, para que este aconteça deve haver vários intervenientes desde o encenador, o cenógrafo, o iluminotécnico, o homem do som (sonoplastia) e o actor, só para simplificar porque nos bastidores há outros elementos de produção que apoiam o actor ou os actores. Se de facto a UEM quer abrir um curso da teatro ou não, não pude perceber através da notícia dada pela STV.
Na mesma notícia passada pela STV foram entrevistadas três pessoas: um sociólogo que não me lembro do nome, a Manuela Soeiro e o Gilberto Mendes. O último, disse que há anos fazem teatro, referindo-se ao Grupo Gungu e talvez aos demais e eu acho que aquilo não é teatro mas sim palhaçada no palco, pois as pessoas vão ao Teatro Madjedje e não só para darem umas gargalhadas. Não se trata de pôr em causa a qualidade humorístico do espectáculo que é dado pelos grupos de teatro que seguem a linha do Gungu, porque faz rir mesmo, basta assistir a “skecthes” publicitários que passam na televisão.
A falta de espectáculo de circo, onde reina o palhaço, faz com que o público amante da arte de entretenimento sobre o palco fique sem opção e olhe para o actor como um palhaço. E os nossos chamados actores não têm escolha, pouco ou nada podem fazer para mudar o sistema do teatro de improvisação sem texto. Uma dose de humor numa peça teatral é muito bem-vinda mas é diferente de constante e desenfreada tentativa de fazer rir às gargalhadas o espectador usando uma realidade onde muitas vezes o espectador facilmente se identifica. Esta prática poderá ter aspectos positivos em termos de crítica social à realidade que vivemos mas os seus efeitos educativos são muito fracos.
Acho que precisamos urgentemente de uma escola de drama não a nível superior mas onde se ensinam os primeiros passos de iniciação de actores seja de teatro, televisão. Uma escola de drama onde os estudantes e os profissionais experimentados em áreas como arte comunitária, antropologia, economia, arquitectura, sociologia e estudos de desenvolvimento, promovem a compreensão dos papéis e processos criativos que podem jogar não só na melhoria da qualidade e claridade de comunicação para o desenvolvimento mas também de criar capacidade de ligação com a comunidade para que este possa lidar com as barreiras do seu próprio desenvolvimento e facilmente se representar e expressar a níveis nacional, regional e internacionalmente.
Precisamos de ensinar drama às nossas crianças, como se ensina a dança não só para podermos “exportar” actores para as telenovelas, mas também para adquirirem capacidade e confiança para facilitarem processos de arte centradas na participação popular e poderem servir de especialistas com experiências de práticas de teatro comunitário e “media” nos diferentes contextos da sociedade moçambicana, para poderem trabalhar como facilitadores usando bem as estratégias culturais na determinação de critérios sustentáveis de desenvolvimento das comunidades, servirem de pessoal de ligação entre as comunidades e as agências de desenvolvimento.
A UEM como uma instituição de ensino poderia considerar mais uma forma de transmissão e partilha de conhecimento, refiro-me àquela de cursos curtos, não necessariamente as tradicionais licenciaturas, refiro-me aos chamados cursos de verão ou de inverno. O teatro, dança, pintura e a música são essencialmente artes, as suas componentes práticas podem ser ensinadas por profissionais destas áreas e não necessariamente professores doutores engravatados, estes profissionais poderiam ser convidados sazonalmente para transmitir os seus conhecimentos.
Abrir uma faculdade de teatro ou simplesmente um curso de teatro precisa ainda de um líder, que tenha experiência comprovada na área e de preferência alguém que tenha um “background” académico ao mesmo tempo. Esta liderança é necessária para enfrentar professores doutores mal-intencionados, mas que querem meter a mão onde não devem e é fácil ver que estamos desprovidos deste tipo de liderança. Aquando da abertura da Faculdade de Arquitectura e Planeamento Físico houve engenheiros que queriam reduzir aquela faculdade num departamento de engenharia, valeu ter o nosso arquitecto mor.
P.S. Saúdo o Elias Macovela, um iluminotécnico de referência no teatro e cinema em Portugal e Josefina Massango, a primeira actriz moçambicana a fazer um monólogo
Viriato Tamele - Arquitecto
3 comments:
patricio qual é a relacao entre o watson e o facto de a UEM estar a planear a introducao do curso de teatro?
Oi. Jorge, foi um momento de excesso. Ainda bem que estas atento, mas antes do teu comentário eu próprio já havia retirado a frase. Materia para debatermos é a que postei a seguir. Estou a espera, em particular, da tua reacção.abrs
os excesso tem dessas coisas, confunde os atentos. quanto ao post a seguir, nao tenho comentarios.
Post a Comment