Guegas em cruzada, António Eneana, contra a preguiceira aguda. Há moçambicanos que se cansam de tanto descansar, defende o nosso chefe de Estado, que para demonstar que faz o contrário vai helicópterovoando o país adentro dizem em pré campanha para o ciclo eleitoral que se avizinha. E como um bom médico, daqueles que basta olhar o seu paciente para sacar-lhe o diagnóstico, identificou o problema: Preguiceira aguda! Como é que podem ser patrões se sucumbem aos prazeres da ociosidade? Cansam-se de tanto descansar.
Pena que as leituras das nossas elites intelectuais, conselheiras do nosso chefe de Estado, os ‘brain trust’, parece não lhe passarem algumas leituras quem sabe com algumas sugestões de antídotos contra a preguiceira aguda. É que, outrora, no recente passado colonial já tivemos a experiência da introdução da obrigação para o trabalho. Recordar-se-ão os mais atentos ou menos esquecidos, ou quem sabe, os mais lidos que foi por causa da sua intervenção crítica, na esfera pública Portuguesa, que António Enes acabou indicado para comissário régio de Moçambique. Como tal fora responsabilizado pela reforma do sector do trabalho nativo de modo a torná-lo mais produtivo. Na visão Eneana a exploração da força de trabalho nativo, sem a conotação esclavagista já abolida e por isso proibida, era a saída airosa que Portugal precisava se ainda quisesse sonhar com a glória imperial num ambiente hostil a escravatura. Para tal Enes viu na cruzada moral da civilização dos nativos a saída. Ao obrigar os moçambicanos a trabalhar não estava a fazer nada mais senão a cumprir com o seu dever moral de os civilizar. O regulamento do trabalho indígena foi o instrumento legal usado por Enes para lograr seus intentos nesse sentido. Assim, a relação entre as autoridades coloniais e os nativos era mediada por aquilo que os primeiros viam como sendo seu dever perante os nativos, nomeadamente, força-los a viver do suor do seu próprio trabalho. Existem páginas interessantes sobre este assunto em Negotiating Modernity: Africa’s ambivalent experience, editado por Elísio Macamo (Codesria, 2005). De quem mais poderia ser?
Existe um sabor, Eneano, anacrónico, na cruzada moral de Guebas contra a preguiça. A diferença é que, independentemente, dos seus intentos coloniais, Enes conferia legitimidade as suas intervenções com argumentos pretensamente científicos, mesmo que enviesados. A constatação do missionário e antropólogo (etnógrafo) Suíço, Henri-Alexandre Junod, que escreveu duas volumosas monografias sobre os Tsonga do sul de Moçambique, segundo a qual os homens africanos viviam do trabalho das mulheres é uma delas. Os homens viviam a custa e as expensas das mulheres argumentava. O contributo dos homens num ano era apenas de três meses e os restantes nove eram de ociosidade. O que estou a tentar dizer, aqui, é que as decisões eram baseadas ou, pelo menos, justificadas com argumentos buscados de gente cujo trabalho era produzir esse tipo de argumentos. Não me parece ser o caso dos pronunciamentos do nosso presidente. Parece que fala ao sabor da euforia dos comícios.
O presidente está a cometer um deslize. E os seus sequazes estão a aplaudir. Na verdade não sou de opinião que o chefe de Estado deva saber tudo sobre tudo. O chefe de Estado, afinal, é tão humano quanto qualquer um de nós na limitação ao conhecimento. Só assim entendo a necessidade de assessores disto e daquilo no seu staff. Reparem que até de assessores estrangeiros o nosso chefe de Estado dispõem, mesmo que eu não perceba a sua utilidade senão para empregar gente que quer viver do nosso infortúnio. Os pronunciamentos públicos do presidente deviam ser cuidadosamente preparados mesmo quando de comício se tratasse. Mas como esperar o contrário num país onde ministros e reitores de áreas educacionais acham que os cientistas sociais existem de sobra e os mandam para sombra. Esses provavelmente diagnosticassem melhor as causas de cujo efeito se acha que é a preguiça.
Pena que as leituras das nossas elites intelectuais, conselheiras do nosso chefe de Estado, os ‘brain trust’, parece não lhe passarem algumas leituras quem sabe com algumas sugestões de antídotos contra a preguiceira aguda. É que, outrora, no recente passado colonial já tivemos a experiência da introdução da obrigação para o trabalho. Recordar-se-ão os mais atentos ou menos esquecidos, ou quem sabe, os mais lidos que foi por causa da sua intervenção crítica, na esfera pública Portuguesa, que António Enes acabou indicado para comissário régio de Moçambique. Como tal fora responsabilizado pela reforma do sector do trabalho nativo de modo a torná-lo mais produtivo. Na visão Eneana a exploração da força de trabalho nativo, sem a conotação esclavagista já abolida e por isso proibida, era a saída airosa que Portugal precisava se ainda quisesse sonhar com a glória imperial num ambiente hostil a escravatura. Para tal Enes viu na cruzada moral da civilização dos nativos a saída. Ao obrigar os moçambicanos a trabalhar não estava a fazer nada mais senão a cumprir com o seu dever moral de os civilizar. O regulamento do trabalho indígena foi o instrumento legal usado por Enes para lograr seus intentos nesse sentido. Assim, a relação entre as autoridades coloniais e os nativos era mediada por aquilo que os primeiros viam como sendo seu dever perante os nativos, nomeadamente, força-los a viver do suor do seu próprio trabalho. Existem páginas interessantes sobre este assunto em Negotiating Modernity: Africa’s ambivalent experience, editado por Elísio Macamo (Codesria, 2005). De quem mais poderia ser?
Existe um sabor, Eneano, anacrónico, na cruzada moral de Guebas contra a preguiça. A diferença é que, independentemente, dos seus intentos coloniais, Enes conferia legitimidade as suas intervenções com argumentos pretensamente científicos, mesmo que enviesados. A constatação do missionário e antropólogo (etnógrafo) Suíço, Henri-Alexandre Junod, que escreveu duas volumosas monografias sobre os Tsonga do sul de Moçambique, segundo a qual os homens africanos viviam do trabalho das mulheres é uma delas. Os homens viviam a custa e as expensas das mulheres argumentava. O contributo dos homens num ano era apenas de três meses e os restantes nove eram de ociosidade. O que estou a tentar dizer, aqui, é que as decisões eram baseadas ou, pelo menos, justificadas com argumentos buscados de gente cujo trabalho era produzir esse tipo de argumentos. Não me parece ser o caso dos pronunciamentos do nosso presidente. Parece que fala ao sabor da euforia dos comícios.
O presidente está a cometer um deslize. E os seus sequazes estão a aplaudir. Na verdade não sou de opinião que o chefe de Estado deva saber tudo sobre tudo. O chefe de Estado, afinal, é tão humano quanto qualquer um de nós na limitação ao conhecimento. Só assim entendo a necessidade de assessores disto e daquilo no seu staff. Reparem que até de assessores estrangeiros o nosso chefe de Estado dispõem, mesmo que eu não perceba a sua utilidade senão para empregar gente que quer viver do nosso infortúnio. Os pronunciamentos públicos do presidente deviam ser cuidadosamente preparados mesmo quando de comício se tratasse. Mas como esperar o contrário num país onde ministros e reitores de áreas educacionais acham que os cientistas sociais existem de sobra e os mandam para sombra. Esses provavelmente diagnosticassem melhor as causas de cujo efeito se acha que é a preguiça.
1 comment:
'Sejamos pregiçosos em tudo, excepto em amar e em beber, excepto em sermos preguiçosos'-Lessing
Elton B.
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