Regresso ao blog, após pouco mais de uma semana ausente, muita coisa aconteceu. Revogação de decretos ilegais, “crime na corporação”, incêndio no ministério da agricultura, enfim, um terreno fértil para reflexão do "Estado da Nação"! Muita matéria-prima, para tão poucos exploradores, das sociologias do direito, sociologia do crime, sociologia das organizações para não falar noutras disciplinas. E por que não, para o simples onipar do bom senso? E ainda há quem ache que temos cientistas sociais por demais neste país! Regresso, timidamente porque ainda não disponho de tempo para mais, com o anúncio de uma conferência em memória de Ruth First. Agradeço a professora Amélia Souto, um das organizadoras do evento, pelo envio do anúncio.
Moçambique no Contexto da África Austral e os Desafios do Presente: Repensando as Ciências Sociais
(Conferência em memória de Ruth First, na passagem dos 25 anos do seu assassinato)
Centro de Estudos Africanos/Universidade Eduardo Mondlane
Maputo, 17 de Agosto de 2007
(Conferência em memória de Ruth First, na passagem dos 25 anos do seu assassinato)
Centro de Estudos Africanos/Universidade Eduardo Mondlane
Maputo, 17 de Agosto de 2007
Apelo a apresentação de comunicações
Moçambique torna-se independente a 25 de Junho de 1975 e o Governo estabelece a sua política externa, definindo como uma das suas prioridades, o apoio não só aos movimentos de libertação africanos, com realce para a luta do Zimbabwe e Namíbia, mas também à luta dos povos oprimidos, com relevo para a luta do povo sul-africano contra o apartheid. No plano interno, a sua estratégia de desenvolvimento económico e social visava a criação de uma sociedade mais justa e igualitária. Estas opções conjugadas vão levar a um confronto aberto com a Rodésia e a África do Sul, mas vão também conduzir o país a uma situação política, económica, financeira e social extremamente difícil e conturbada.
A agudização de conflitos entre a África do Sul e os restantes países da região, a guerra civil e a difícil situação político-militar que se vive em Moçambique, são factores decisivos na busca de alternativas internas, depois dos acordos e parcerias regionais estabelecidas no quadro da SADCC e países da Linha da Frente. São claros exemplos desta situação o Acordo de Nkomati e as negociações com o FMI/Banco Mundial em meados da década de 80, e o seu desembocar no Plano de Reabilitação Económica em 1987. Nessa esteira, há também mudanças na arquitectura política interna que culminarão com a revisão da Constituição em 1990. A assinatura do Acordo de Paz em Outubro de 1992, põem formalmente fim à guerra civil, abrindo mais uma página na história do país.
O período pós-conflito traz novos desafios a Moçambique, nomeadamente: levar a cabo o difícil processo de reconciliação, criando condições de inclusão de todas as sensibilidades sociais e, assim, sarando as feridas da guerra;implementar e consolidar um sistema democrático multipartidário, tal como o previsto no Acordo Geral de Paz; e relançar o desenvolvimento social e económico em moldes novos, baseados na iniciativa privada e na economia de mercado. A estas questões podemos talvez acrescentar uma quarta, a da criação de condições para a integração do país na estrutura regional da África Austral, a SADC, segundo o calendário e os ritmos definidos.
As crises de pensamento decorrentes das grandes mudanças que ocorreram no mundo durante a última metade do século XX e início deste século levaram as Ciências Sociais a acelerar a sua reconceptualização, num esforço tendente a clarificar e redefinir o seu papel na sociedade. Hoje, mais do que nunca, se debate sobre a finalidade das Ciências Sociais e o seu papel na sociedade. Questiona-se, ainda, se elas proporcionam um aconselhamento sábio sobre problemas do presente; ajudam os seres humanos a interpretar o mundo que os rodeia para melhor agirem sobre o mesmo; e se contribuem para uma maior eficácia das decisões políticas e administrativas.
Desde os finais do século XX que se discute o surgimento de um novo modo de produção do conhecimento, e se defende que as pesquisas são desenvolvidas a partir da necessidade de resolver problemas práticos e não apenas de interesses cognitivos, como pesquisa básica. A ideia da multidisciplinaridade, introduzida entre as duas guerras, ganhou importância e legitimidade no pós-segunda guerra mundial, ao suscitar a necessidade de transpor as barreiras entre disciplinas em direcção a uma transdisciplinaridade e a uma heterogeneidade institucional crescente. Desta feita, tornou-se possível às universidades e outras instituições de pesquisa estabelecer interfaces com o governo, as ONGs e as empresas. Apesar dos constrangimentos por que passam as instituições de ensino superior nos últimos anos, se espera que as universidades e institutos de pesquisa, na sua relação com a sociedade, sejam capazes de definir novos domínios do conhecimento, fazer diagnósticos e trazer soluções no âmbito da sua responsabilidade social.
As Ciências Sociais em África têm contribuído para o estudo das novas relações de trabalho, novos processos educacionais e de produção de conhecimento, formas de violência, estrutura rural, emancipação feminina, novas formas de constituição de identidades individuais e colectivas, vários tipos de expressão das desigualdades sociais, entre um número incontável de temáticas. A cultura científica hoje, tornou-se uma importante dimensão constitutiva das sociedades contemporâneas, enquanto recurso e enquanto problema, na medida em que interfere com todos os domínios da vida social. O cientista social deve, assim, pautar as suas pesquisas por uma postura crítica, e independente, porque a ciência só se desenvolve num contexto de liberdade académica e autonomia universitária, já que não podemos continuar ignorantes da realidade social que nós próprios construímos.
Em Moçambique, do período da produção socialista à economia de mercado e ao processo de paz e reconstrução do país, a produção em Ciências Sociais e Humanas mostra-nos a marcada influência dos diversos desafios, transições e reformas que num período tão curto abrangeram Moçambique e o esforço levado a cabo para fazer diagnósticos e procurar respostas para os problemas existentes. Assim, o processo relativo à implantação de uma economia e uma sociedade socialistas, o impacto da guerra, a resolução de conflitos, o processo de paz e a construção de uma sociedade democrática, a pobreza, a questão da terra, mulher e género, línguas moçambicanas e várias outras problemáticas, e mais recentemente, as consequências dos impactos do HIV/SIDA e outras doenças endémicas, marcam a produção científica nacional. Não se pode de modo algum ignorar o contexto regional, onde a dominação económica sul-africana, o regime do apartheid e a nova África Austral pós-apartheid, bem como a dinâmica da cooperação, paz, segurança e políticas de integração regional, fazem também parte dos interesses dos investigadores em Ciências Sociais ao longo destes períodos.
Hoje, no nosso país, debatem-se assuntos relacionados com a pobreza, o desemprego, a exclusão social, a construção de democracias e da paz, a governação participativa, a segurança e a pandemia do HIV/SIDA. Os cientistas sociais Moçambicanos devem com as suas análises contribuir para a construção de uma democracia enraizada num conhecimento da realidade nacional, regional ou africana, na valorização da produção de conhecimentos locais, e por uma sociedade mais livre e justa.
Cabe-nos então reflectir como ultrapassar os obstáculos que vão para além das dificuldades em acesso a recursos, ou dependência de agendas, para repensar o papel das ciências sociais como um espaço por excelência de formação e de intervenção social.
“Moçambique no Contexto da África Austral e os Desafios do Presente: Repensando as Ciências Sociais”, é o tema de fundo em redor do qual nos propomos celebrar a memória de Ruth First, nos 25 anos do seu assassinato, no seu gabinete de trabalho no Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo. Trata-se não só de um tema estimulante, como desafiante. Por um lado, porque vai ao encontro do que foram os ideais de Ruth First e Aquino de Bragança, que utilizaram o trabalho académico para fazer o diagnóstico e procurar respostas para os problemas da região e do papel de Moçambique neste processo. Por outro lado, porque se vive presentemente um momento de crise em que se fazem não só interrogações constantes sobre o papel que as Ciências Sociais devem desempenhar no desenvolvimento nacional, mas também se questionam aspectos relativos à qualidade do ensino e da pesquisa científica.
O Seminário de um dia revisitará assim a história de Moçambique pós-independente no contexto da África Austral, tendo em vista discutir o papel das ciências sociais na procura de respostas aos problemas nacionais e regionais. O facto de se realizar sob os auspícios do Centro de Estudos Africanos, este seminário representa: i) por um lado, a homenagem que a UEM faz a Ruth First que desempenhou as funções de directora científica e investigadora do CEA, mas também uma homenagem a todos os cientistas sociais, que como ela, se empenharam na luta contra o apartheid e pela paz e progresso do continente; ii) por outro lado, e de forma simbólica, o papel que o Centro de Estudos Africanos desempenhou no “volte face”das ciências sociais no Moçambique independente, com realce para a sua função de diagnosticar e procurar respostas para os problemas nacionais.
O Comité Científico do Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane, convida assim todos os interessados em apresentar artigos a esta conferência, a submeterem um resumo breve variando entre 150 a 300 palavras, em linguagem clara e informativa, com uma indicação do conteúdo da apresentação e seu argumento principal. O resumo deverá ser apresentado em letra 12, formato Times New Roman, 1 espaço, e enviado até 30 de Junho de 2007, para o seguinte endereço: ruthfirstconferencia@yahoo.com.br
Até 15 de Julho, os participantes a este seminário serão informados sobre os resultados da selecção de resumos e receberão outras orientações relativas à apresentação das suas comunicações.
Moçambique torna-se independente a 25 de Junho de 1975 e o Governo estabelece a sua política externa, definindo como uma das suas prioridades, o apoio não só aos movimentos de libertação africanos, com realce para a luta do Zimbabwe e Namíbia, mas também à luta dos povos oprimidos, com relevo para a luta do povo sul-africano contra o apartheid. No plano interno, a sua estratégia de desenvolvimento económico e social visava a criação de uma sociedade mais justa e igualitária. Estas opções conjugadas vão levar a um confronto aberto com a Rodésia e a África do Sul, mas vão também conduzir o país a uma situação política, económica, financeira e social extremamente difícil e conturbada.
A agudização de conflitos entre a África do Sul e os restantes países da região, a guerra civil e a difícil situação político-militar que se vive em Moçambique, são factores decisivos na busca de alternativas internas, depois dos acordos e parcerias regionais estabelecidas no quadro da SADCC e países da Linha da Frente. São claros exemplos desta situação o Acordo de Nkomati e as negociações com o FMI/Banco Mundial em meados da década de 80, e o seu desembocar no Plano de Reabilitação Económica em 1987. Nessa esteira, há também mudanças na arquitectura política interna que culminarão com a revisão da Constituição em 1990. A assinatura do Acordo de Paz em Outubro de 1992, põem formalmente fim à guerra civil, abrindo mais uma página na história do país.
O período pós-conflito traz novos desafios a Moçambique, nomeadamente: levar a cabo o difícil processo de reconciliação, criando condições de inclusão de todas as sensibilidades sociais e, assim, sarando as feridas da guerra;implementar e consolidar um sistema democrático multipartidário, tal como o previsto no Acordo Geral de Paz; e relançar o desenvolvimento social e económico em moldes novos, baseados na iniciativa privada e na economia de mercado. A estas questões podemos talvez acrescentar uma quarta, a da criação de condições para a integração do país na estrutura regional da África Austral, a SADC, segundo o calendário e os ritmos definidos.
As crises de pensamento decorrentes das grandes mudanças que ocorreram no mundo durante a última metade do século XX e início deste século levaram as Ciências Sociais a acelerar a sua reconceptualização, num esforço tendente a clarificar e redefinir o seu papel na sociedade. Hoje, mais do que nunca, se debate sobre a finalidade das Ciências Sociais e o seu papel na sociedade. Questiona-se, ainda, se elas proporcionam um aconselhamento sábio sobre problemas do presente; ajudam os seres humanos a interpretar o mundo que os rodeia para melhor agirem sobre o mesmo; e se contribuem para uma maior eficácia das decisões políticas e administrativas.
Desde os finais do século XX que se discute o surgimento de um novo modo de produção do conhecimento, e se defende que as pesquisas são desenvolvidas a partir da necessidade de resolver problemas práticos e não apenas de interesses cognitivos, como pesquisa básica. A ideia da multidisciplinaridade, introduzida entre as duas guerras, ganhou importância e legitimidade no pós-segunda guerra mundial, ao suscitar a necessidade de transpor as barreiras entre disciplinas em direcção a uma transdisciplinaridade e a uma heterogeneidade institucional crescente. Desta feita, tornou-se possível às universidades e outras instituições de pesquisa estabelecer interfaces com o governo, as ONGs e as empresas. Apesar dos constrangimentos por que passam as instituições de ensino superior nos últimos anos, se espera que as universidades e institutos de pesquisa, na sua relação com a sociedade, sejam capazes de definir novos domínios do conhecimento, fazer diagnósticos e trazer soluções no âmbito da sua responsabilidade social.
As Ciências Sociais em África têm contribuído para o estudo das novas relações de trabalho, novos processos educacionais e de produção de conhecimento, formas de violência, estrutura rural, emancipação feminina, novas formas de constituição de identidades individuais e colectivas, vários tipos de expressão das desigualdades sociais, entre um número incontável de temáticas. A cultura científica hoje, tornou-se uma importante dimensão constitutiva das sociedades contemporâneas, enquanto recurso e enquanto problema, na medida em que interfere com todos os domínios da vida social. O cientista social deve, assim, pautar as suas pesquisas por uma postura crítica, e independente, porque a ciência só se desenvolve num contexto de liberdade académica e autonomia universitária, já que não podemos continuar ignorantes da realidade social que nós próprios construímos.
Em Moçambique, do período da produção socialista à economia de mercado e ao processo de paz e reconstrução do país, a produção em Ciências Sociais e Humanas mostra-nos a marcada influência dos diversos desafios, transições e reformas que num período tão curto abrangeram Moçambique e o esforço levado a cabo para fazer diagnósticos e procurar respostas para os problemas existentes. Assim, o processo relativo à implantação de uma economia e uma sociedade socialistas, o impacto da guerra, a resolução de conflitos, o processo de paz e a construção de uma sociedade democrática, a pobreza, a questão da terra, mulher e género, línguas moçambicanas e várias outras problemáticas, e mais recentemente, as consequências dos impactos do HIV/SIDA e outras doenças endémicas, marcam a produção científica nacional. Não se pode de modo algum ignorar o contexto regional, onde a dominação económica sul-africana, o regime do apartheid e a nova África Austral pós-apartheid, bem como a dinâmica da cooperação, paz, segurança e políticas de integração regional, fazem também parte dos interesses dos investigadores em Ciências Sociais ao longo destes períodos.
Hoje, no nosso país, debatem-se assuntos relacionados com a pobreza, o desemprego, a exclusão social, a construção de democracias e da paz, a governação participativa, a segurança e a pandemia do HIV/SIDA. Os cientistas sociais Moçambicanos devem com as suas análises contribuir para a construção de uma democracia enraizada num conhecimento da realidade nacional, regional ou africana, na valorização da produção de conhecimentos locais, e por uma sociedade mais livre e justa.
Cabe-nos então reflectir como ultrapassar os obstáculos que vão para além das dificuldades em acesso a recursos, ou dependência de agendas, para repensar o papel das ciências sociais como um espaço por excelência de formação e de intervenção social.
“Moçambique no Contexto da África Austral e os Desafios do Presente: Repensando as Ciências Sociais”, é o tema de fundo em redor do qual nos propomos celebrar a memória de Ruth First, nos 25 anos do seu assassinato, no seu gabinete de trabalho no Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo. Trata-se não só de um tema estimulante, como desafiante. Por um lado, porque vai ao encontro do que foram os ideais de Ruth First e Aquino de Bragança, que utilizaram o trabalho académico para fazer o diagnóstico e procurar respostas para os problemas da região e do papel de Moçambique neste processo. Por outro lado, porque se vive presentemente um momento de crise em que se fazem não só interrogações constantes sobre o papel que as Ciências Sociais devem desempenhar no desenvolvimento nacional, mas também se questionam aspectos relativos à qualidade do ensino e da pesquisa científica.
O Seminário de um dia revisitará assim a história de Moçambique pós-independente no contexto da África Austral, tendo em vista discutir o papel das ciências sociais na procura de respostas aos problemas nacionais e regionais. O facto de se realizar sob os auspícios do Centro de Estudos Africanos, este seminário representa: i) por um lado, a homenagem que a UEM faz a Ruth First que desempenhou as funções de directora científica e investigadora do CEA, mas também uma homenagem a todos os cientistas sociais, que como ela, se empenharam na luta contra o apartheid e pela paz e progresso do continente; ii) por outro lado, e de forma simbólica, o papel que o Centro de Estudos Africanos desempenhou no “volte face”das ciências sociais no Moçambique independente, com realce para a sua função de diagnosticar e procurar respostas para os problemas nacionais.
O Comité Científico do Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane, convida assim todos os interessados em apresentar artigos a esta conferência, a submeterem um resumo breve variando entre 150 a 300 palavras, em linguagem clara e informativa, com uma indicação do conteúdo da apresentação e seu argumento principal. O resumo deverá ser apresentado em letra 12, formato Times New Roman, 1 espaço, e enviado até 30 de Junho de 2007, para o seguinte endereço: ruthfirstconferencia@yahoo.com.br
Até 15 de Julho, os participantes a este seminário serão informados sobre os resultados da selecção de resumos e receberão outras orientações relativas à apresentação das suas comunicações.
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