Saturday, May 12, 2007

Dizer, sem dizer, que J.Ngoenha morreu de SIDA!



Volto a referir-me ao “impropério” para alguns e ao acto de “coragem” para outros que foi o pronunciamento de Stewart Sukuma com relação as causas da morte de Jeremias Ngoenha. É claro que divide opiniões. Não podia ser diferente sendo uma questão que mexe com princípios ético e morais da nossa sociedade. É como debater sobre o aborto, a penalização ou não das raparigas que engravidem na escola, a barriga de aluguer, a clonagem humana ou de órgãos e por ai em diante. É difícil tocar nestes assuntos sem os polemizar. Requereria muito discernimento, prudência e decência por parte dos intervenientes no debate. Essas são qualidades ainda por conquistar no debate que se faz de ideias na nossa esfera pública. Da minha parte já disse o que acho, e inclusivamente aceitei os contra-argumentos dos meus críticos e interlocutores. Sukuma poderia estar, e não tenho razões para disso discordar, frustrado perante a impotência de salvar uma vida que poderia ser prolongada.

Dizer, sem dizer que Jeremias Ngoenha morreu de SIDA!

Se repararmos para a reportagem que é feita sobre este assunto no Jornal nota se quão temerário e por isso ambíguo é o Jornalista em chamar as coisas pelos seus próprios nomes. Em nenhum momento se fala explicitamente que Jeremias Ngoenha padecia e morreu do Vírus causador da SIDA. No entanto é, tacitamente, apresentada aquela que seria a solução que, no mínimo, prolongaria a sua vida. “ Apesar de grande parte da população não ter acesso aos anti-retro virais, há uma consciência plena sobre esta doença, e Jeremias era uma pessoa influente com todos os mecanismos para se safar da doença”. Destas premissas deriva a conclusão necessária e lógica de que Jeremias Ngoenha morreu de SIDA! Pois, que eu saiba, toma antiretrovirais quem padece de HIV/SIDA! Lá mais para baixo da reportagem Paulo Babrulu surge particularmente crítico no que respeita a atitude, que considera de hipócrita, de se considerar uma doença crónica como sendo fatal. Desmistificar certas coisas leva o seu tempo, mudar a maneira de pensar da sociedade ainda mais.
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7 comments:

chapa100 said...

aqui esta um fenomeno que merece um bom debate. uma parte interessante deste debate nao esta a discutir 1)a protecao social que devia beneficiar o jeremias, 2) a pirataria que impossiblita o musico mocambicano, a criar renda e riqueza, 3) os unicos que podem confirmar que jeremias padecia de SIDA e o medico ou o hospital onde jeremias foi tratado,4) o acesso a informacao (que podia evitar essa ignorancia) so e efctiva se for acompanhado de servicos de saude acessiveis e adequados; 5) a prevencao do SIDA sem olhar para factores culturais, sociais e economicos que promovem e legitimam comportamentos de risco, a nossa luta contra o SIDA nao passa de uma brincadeira.

o sukuma saiu da estrada com o seu comentario.

Patricio Langa said...
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Patricio Langa said...

J.M
1. Como referi antes, a declaração do estado serológico, para mim, em nenhuma circunstância deveria ser condição sine qua non para a pessoa receber a devida protecção social de que falas. A pessoa deve, no meu entender, ser livre de revelar ou não a quem achar que quer revelar. Duvido que ninguém soubesse qual é o estado do J.Ngoenha. É por esses mecanismos que pessoas como Stewart, se o quisessem, efectivamente, poderiam ter ajudado. Não se pergunta a um escravo se quer ser liberto, liberta-se, dizia Samora Machel. Comparação pode não parecer a mais adequada, mas vale.
2. O simples facto de se exigir que pessoa se confidencie, mesmo sem querer, revela quão mistificada é a estigmatização. Stewart nunca deu a entender até que ponto era chagado ao J. Ngoenha a ponto de ter tido a expectativa de merecer a confiança daquele para o revelar seja o que for. Quando alguém tem malária tem que sair e anunciar que esta mal de malária? Porque tem que dizer quando se trata de ser seropositivo? A pessoa esta doente e pronto! É tudo que se precisa saber para ajudá-la. Ademais existe diferença entre um seropositivo e um doente de SIDA. Jeremias estava – mesmo que não fosse por complicações ligadas ao HIV, pois bem dissestes apenas os médicos e ele o poderiam saber – visivelmente doente. Essa facto era mais do que suficiente para que merecesse a protecção de que falas.

3. Quanto a mim é preciso que se criem políticas que ajudem de facto as pessoas. De boas intenções está cheio o inferno. Há gente que já fez e continua a fazer fortuna com o infortúnio dos outros. Vivem enquanto outros morrem de SIDA. Os que vivem fazem-no no intuito de ajudar aos que morrem. Ninguém sabe melhor do que si próprio como se ajudar a manter vivo. Claro os médicos dão uma mão. É por isso que me incomoda essa ideia da estupidez e ignorância.

4. Quanto a pirataria. Concordo que se faça algo para travá-la. Mas travá-la por completo é impossível! Creio. No entanto, tenho as minhas dúvidas quanto a ideia de que sem ela os nossos músicos, pelo menos a maioria, estariam economicamente bem. O problema é mais complexo do que a pirataria pode parecer revelar. Quantos Moçambicanos têm capacidade para comprar um disco original? Contam-se! Não se pode fazer uma indústria discográfica de milionários num país onde até um professor universitário vive de downloads de MP3. E este é apenas um exemplo. São poucos os que se podem dar bem como o Patrão que é Patrão.

chapa100 said...

imagina patricio, se o jeremias tivesse direito aos direitos autoriais e discograficos das suas musicas tocadas nas descotecas do pais, nas radios nacionais, ate na nossa TVM? fiz parte do grupo de mocambicanos que estiveram envolvidos na criacao do SOMAS, a legislacao de direitos de autores, o selo descografico, lei do mecenato, instrumentos practicos para recolha e distribuicao dos valores monetarios e posterior distribuicao para artistas mocambicanos, no nosso pais nao faltam instrumentos legais falta sim é vontade politica para por a inspeccao do INLD, ministerio da industria e comercio, da cultura, e a policia mocambicana a funcionar. tivemos ate visitas de experts de portugal, africa do sul, etc, que estiveram ca para mostrar que isso funciona, e o nosso governo ja foi criticado por entidades ligadas a industria descografica mundial e regional sobre o deixa andar da pirataria em mocambique. o estado perde milhoes de dolares com este deixa andar, e ate existe um mapeamento das casas de musica, e "quintais" comerciais que promovem a pirataria, mas esses ate sao bem poderosos patricio, pergunta aos musicos mocambicanos, eles sabem dessas casas que andam a distribuir aos dumba nengueiros os CD e DVDs piratados e com conivencia de instituicoes do estado.

jeremias, zaida, carlos, alexandre langa, pfumo, e muitos outros foram e sao ate hoje vitimas deste deixa andar. o vice da cultura, dele esperavamos muito, que pudesse pelo menos chamar estas instituicoes do estado a razao e resolver de uma vez por todas esta brincadeira de mau gosto. nao é verdade que o mocambicano nao tem poder de compra, alem de com os CDs piratados estarmos a promover a fuga ao fisco, ao roubo dos direitos autoriais e riqueza aos artistas, estamos a promover uma burla ao consumidor, ele compra produto sem garantia de qualidade e ilegal.

é preciso estudar esta relacao entre o MP3 e o fraco poder de compra. acredito mais que o MP3 trouxe a capacidade tecnologica e de facil maneio/acesso da musica para o consumidor.

Patricio Langa said...

Oi J.M
Penso que não percebeu bem o que eu quis dizer.
Não quis, ao sugerir que a nossa industria musical não tem condições de produzir milionários, fazer de advogado do diabo. A pirataria tem seus malefícios sim. A pirataria reduz em grande medida aquilo que seriam os rendimentos dos músicos, sim. É preciso que se seja mais vigilante e que as instituições funcionem, sim. O que eu estava a sugerir é que, mesmo com todas esses mecanismos para combater a pirataria a funcionarem correctamente, não temos condições de produzir milionários a partir da música somente a contar com o mercado nacional. O mercado moçambicano, nem sei bem se lhe podemos chamar mercado, é incipiente e seus agentes descapitalizados. Existe baixo poder de compra sim. Existe muito pouca gente com poder de compra razoável, para se dar ao luxo de comprar discos quem andam acima dos 300 mtn. Somos apenas 19 a 20 milhões de Moçambicanos e desses apenas um punhado não tem preocupações para satisfazer necessidades básicas. E isto não ocorre, como sugeres, por falta de vontade politica. Poderia dizer o mesmo em relação ao desporto. Quem se tornou milionário por jogar futebol, dentro do país ou até na região Austral (africa do Sul)?Em suma, o que te estou a sugerir é que o mercado ainda é incipiente, e de pequenas dimensões. É claro que a pirataria só vem piorar as coisas, em si já difíceis.

chapa100 said...

patricio. o musico nao precisa ser milionario, precisa que a sua propriedade intelectual seja protegida e pago pelo trabalho que produz. nao conheco nenhum pais no mundo que consegue na totalidade controlar a pirataria. mas isso nao pode servir de desculpa para que o estado nao proteja a propriedade intelectual. o que tento aqui dizer patricio é: se o estado combater a pirataria e velar pela propriedade intelectual como a lei preconiza, reduzir a complexidade do seguro e protecao social, operacionalizar a SOMAS e INLD, o estatuto de produtor de cultura, e os musicos como sukuma lutarem para que a AMM funcione como deve ser ai estariamos a fazer muito pela cultura. os penny penny, Dj kwaito, tchaka, e outros na vizinha africa do sul, nao é que sao mais inteligentes e menos ignorantes na riqueza que produziram, muito da riqueza deles é produto do papel do estado na protecao da propriedade industrial que possibilita investimentos de vulto na industria descografica sul africana. nao vamos pedir que os artistas mocambicanos facam como o musico salimo, que em vez de produzir cultura anda a controlar os seus CDs na praca e so vende directamente ao comprador. e o publico acha isso uma piada dele, mas nao ve que aquele musico esta fazer aquilo porque ele é tao vulneravel a pobreza que nao dignifica os homens de cultura no pais.
houve um debate interessante ano passado quando o ministerio da educacao e as editoras de livro escolar queriam passar por cima da propriedade intelectual dos artistas mocambicano.
agora como o patrao ficou rico e outros ficaram ricos so eles podem explicar, e isso significa que com musica pode se produzir riqueza e quais sao os malabarismos que os ZAKA ZA e stuwart fazem nao sei.

em relacao ao futebol, nao conheco muito o mercado de futebol. mas segundo amigos meus, aqueles que foram jogar a africa do sul e levaram a vida profissionalmente voltaram com alguma riqueza, nao milionarios. o clube onde havia gestao eficiente como o costa do sol e ferroviario alguns jogadores serios conseguiram fazer algo. agora o que sei: existe uma proposta de lei para mudar a estrutura orgnica, estatuto juridico dos clubes, permitindo assim a formacao das futuras SAD mocambicanas como acontece na africa do sul, portugal e por mundo fora. isto pode vir a criar riqueza para nossos jogadores, mas para isso precisamos de empresarios desportivos serios e instrumentos legais que funcionem. vamos ver patricio.

Patricio Langa said...

De acordo J.M
Repare, e insisto nisto, que eu não estou a ser advogado do diabo. Não estou a dizer que não se deva fazer de tudo para valorizar a produção e propriedade intelectual. E não é só dos artistas. Tenho visto minhas ideias reproduzidas sem referencia à fonte nos jornais da praça. Isso é chato, apesar de eu não viver comercialmente das minhas ideias. Talvez o problema está na noção de “bem estar”, “riqueza” que cada um de nós tem em mente. É provável que sem esses males que apontas a vida dos nossos artistas fosse mais “folgada” e não produzissem apenas para a sua subsistência. A África do Sul e os músicos. O mercado discográfico sul africano é relativamente grande para se fazerem fortunas. Falamos de cerca de 50 milhões de habitantes. Mesmo considerando ¼ de consumo interno estamos na ordem dos 12.5 milhões. Além disso, praticamente toda a África austral vive (vivia) do consumo de música produzida na África do Sul. O mesmo não acontece com os nossos músicos que só agora começam a ser escutados por nós próprios.
A língua. Os Sul-Africanos, mesmo cantando em línguas locais, fazem o seu marketing em Inglês e são por isso grandes exportadores de música além fronteiros. No nosso caso não é assim! A nossa música não sai, ainda, nem para o ilusório espaço lusofono. Na verdade nem se pode falar de industria cultural musical. É disso que estou a falar. Tico-Tico foi dos que mais sucesso teve nas terras do Rand, fez alguns tostões, mas nada que o garanta para toda vida se não souber investir, como acontece com muitos. Chiquinho Conde está a choramingar aos quatro ventos, o pé de meia esta ficar vazio. Estou a misturar estações/assuntos. Mas a ideia é dizer que em alguns países é ilusório pensar em fazer fortuna por via da arte. É claro a pirataria contribui para tornar as coisas ainda muito mais difíceis. Nisso estou completamente de acordo contigo J.M.