Saturday, March 17, 2007

CARTA ao Professor Carlos Serra!


Professor já vai longa a sua valiosa contribuição, interventora, na questão do “desflorestamento” que supostamente está a ocorrer em Moçambique. Inclusivamente, já tivemos uma secção parlamentar a debater a questão e o questionado sob as suas responsabilidades. Tornou-se uma questão de interesse público, nacional e internacional. A sua denúncia foi vital nesse sentido.

Do meu ponto de vista, porém, fica a impressão de que quanto mais se fala do assunto menos o conhecemos em profundidade. E quando digo conhecer, não limito a questão as implicações prováveis em termos de dano ambiental. Refiro-me a conhecer o fenómeno sob as diferentes perspectivas em que aquele pode ser abordado. A mim, e crio que ao professor também, interessaria saber que olhar a sociologia poderia emprestar ao fenómeno. Parece-me que acima das consequências naturais há causas sociais, nomeadamente a intervenção do homem. Nesse sentido até porque todos fenómenos naturais são sociais. O que é que sabemos sobre isto? Como é que a sociologia nos pode ajudar a compreender o fenómeno? Sinto que ainda há muito por ser feito nesse sentido.

Há uns anos atrás interessei-me pela sociologia do risco e do ambiente. Inclusivamente, em tese de licenciatura, defendia que “ a consciência ecológica” em Moçambique emergira. Como evidência empírica estudei um fenómeno que na altura achei paradigmático, tratou-se do movimento de protesto contra a incineração de resíduos tóxicos na Matola nos finais da década de 90. Teoricamente socorri-me dos sociólogos Alemão e Britânico, Ulrich Beck e Anthony Giddens, que muito escreveram sobre sociologia do risco. Beck por exemplo, tornou-se popular ao defender a tese de que vivemos, actualmente, numa sociedade de risco.

Na minha tese defendia não somente o argumento de que havia sinais de emergência de consciência ecológica. Sugeria a hipótese de que aquela resultava do choque de racionalidades pela definição do risco ambiental. Por outras palavras, o risco que a incineração de resíduos tóxicos na fábrica de cimentos da Matola podia representar não existia em si, mas como resultado de um trabalho argumentativo e de lutas pela sua definição. Naquele caso o governo munira-se de instrumentos científicos para provar que o risco era praticamente “Zero” o mesmo fizeram-no os que achavam que era elevadíssimo. Daí o choque de racionalidades. Houve interesses subjectivos do diferentes grupos de interesse em jogo e isso foi um elemento a considerar para a definição do risco. A Livaningo hoje virou uma ONG ambientalista – com todas as benesses que isso trás – e esse é também um elemento a considerar e incluir no baú dos interesses subjectivos.
Professor já vai longa a minha carta, cuja intenção é colher da sua experiência o papel que caberia a sociologia na questão do “desflorestamento”.

Saudações académicas
Patrício Langa

1 comment:

Egidio Vaz said...

"Professor já vai longa a sua valiosa contribuição, interventora, na questão do “desflorestamento” que supostamente está a ocorrer em Moçambique".

1. Viva Sociologia de cartas!
Seria de facto interessante ouvir a sua posicao em relacao ao desflorestamneto ora em curso.

2. Estou curioso em sbaer o significado que as aspas (") quando se refere ao desflorestamento. Igualmente gostaria de saber se ainda não se deve considerar um FACTO, o desflorestamento em Mocambique. Vejo ai um "supostamente" que, na minha opinião, está mal colocado.
Um abraco.