Até agora não consigo descortinar uma razão plausível para a decisão, do presidente da república, de demitir o ex-ministro da agricultura Tomas Mandlate. Li o considerado argumento que justifica a demissão assim como análises feitas em alguns órgãos de comunicação social e nada. Nada me convence que tenha sido a incompetência do ministro que tenha estado na origem da chicotada psicológica que aquele levou, como se diz em gíria futebolística. Avento até uma teoria, conspiratória. A de que algo ia mal nas relações inter-pessoais no ‘dream team’ de Guebuza. O ministro foi demitido pelos mesmos critérios (presidenciais, nunca claros) com que fora nomeado. Esse é o preço político que se paga onde as nomeações para cargos públicos não obedecem a critérios claros. Ser critério político, não significa não ser claro. E essa é a característica primordial do nosso sistema político, não é claro nas suas regras. Tenho para mim que este é um sistema político assente numa economia politica das afeições. Aonde é que o presidente vai buscar os seus ‘brain-trust’? "Brain trust" é o nome dado ao grupo de diverso de economistas, professores e outros intelectuais, que o presidente do EUA Franklin de Roosevelt usava de conselheiros no seu governo. O comentário da primeira-ministra, reportado na edição de 27 de Fevereiro do Jornal meia noite, ao plano apresentado pelo ministro num dos encontros do governo sugere mau relacionamento entre os membros. “Este é o ministro da agricultura que os Moçambicanos têm” disse a ministra. Seria mais prudente, se se tratava de avaliar o desempenho do ministro apresentar-se com detalhe os critérios dessa avaliação. Isso é que nos permitiria julgar sobre a in/competência do ministro. Esse tipo de comentário só demonstra que as nomeações e demissões do presidente são influenciadas por pessoas, próximas a si, a quem dá ouvido, e que para se manter no pelouro é preciso que se esteja sempre de bem com essas pessoas. Faça se bem ou faça-se mal. Não são os "brain trust", são os "heart trust" que influenciam as decisões!
Não cola o argumento da in/competência do ministro. Não cola porque é um argumento falacioso e fraco. Tanto o que se diz ser do presidente, quanto o dos analistas jornalísticos da nossa praça. Se não vejamos. A razão apresentada pelo PR segundo o editor do jornal O País edição de dois de Março diz: “Nada justifica que passemos fome em Moçambique, mesmo perante calamidades, porque temos um povo trabalhador e determinado; solos ricos e generosos e temos a força da unidade nacional”. Pois bem, pelo que percebo, sugere-se que com todas aquelas condições enunciadas pelo presidente da república, propicias para que ninguém morresse de fome no nosso país, a única razão para a fome que se passa é a incompetência do detentor pelouro da agricultura. Se for este o caso, o argumento é problemático. É problemático porque as premissas sobre as quais assenta a conclusão, da incompetência do ministro, são bastante questionáveis.
A conclusão do presidente é de que a fome que se passa no país não é justificável. Não é justificável porque temos: a) solos ricos e generosos, temos um b) povo trabalhador e determinado, e c) temos a força da unidade nacional. Com estes ingredientes, não se justifica que se passe fome. Este argumento induz-nos a uma inferência necessária, se levada em consideração a acção correctiva do presidente. A de demitir o ministro. Na verdade o presidente já justificou porque se passa fome. Justifica-se que se passe fome. A razão esta implícita na demissão do ministro. É algo relacionado com o ministro que justifica a fome. Incompetência? Um país pode passar fome por enumeras razões alheias a in/competência de um ministro. Que eu saiba já se passava fome antes de Mandlate e com certeza (não se venha dizer que rogo praga ao país) vai-se passar fome com o novo ministro. Podia até ser mais maldoso aqui e perguntar. Passa-se fome em Moçambique? Quem passa fome? É claro que o presidente deve estar a falar como delegado. Mas a simples premissa de que em Moçambique se passa fome é, bastante, questionável. O que o presidente quer dizer quando diz que em Moçambique se passa fome? Sente-se que se quer dizer algo que não está ser dito. Há um vácuo aqui. Passa-se fome na Africa do Sul, no Brasil, na Indonésia, países com uma agricultura muito mais mecanizada e produtiva que a nossa e isso não custa a cabeça dos ministros desses países. Porque foi demitido o ministro da agricultura? Se for pelas razões apresentadas, podia-se até demitir todo o governo e convocar-se novas eleições.
O obsessão jornalística pela demissão.
De algum tempo para cá, a nossa imprensa vive obcecada pela expectativa de ver um ministro a “cair”. Desde o governo de Chissano que essa obcecação vem se alimentado de especulações e de avaliações pouco criteriosas do desempenho dos diversos ministros. É claro que em alguns casos parece até terem existido razões que talvez justificassem demissões. Recordo-me do “escandaloso” caso das bolsas do ex-ministro da educação.
Que eu saiba nunca se debateu com seriedade como se avalia o desempenho de um ministro. No caso, o que se levanta é a in/competência de um ministro. Como se avalia o desempenho de um ministro da agricultura, por exemplo. Pela sua capacidade de acabar como a fome? O que significa concretamente acabar com a fome? Isso é possível num país como o nosso? De que maneira? O ministro traçou mal as políticas para o aumento da produção? Implementou-as com lentidão? O que é que o ministro não fez e que deveria ter feito, concretamente? E se o tivesse feito, num período de dois anos que durou o seu mandato, teria se acabado com a fome no país? Tomemos por empréstimo a analogia do futebol. Um ministro seria, então, como um treinador de futebol. A expressão chicotada psicológica, comum no mundo do futebol, sugere que um treinador fora despedido do comando técnico de uma equipe por maus resultados. Assim como acontecera com Chiquinho Conde no ano transacto no Maxaquene. O Maxaquene estava na cauda da classificação no Moçambola como resultado das consecutivas derrotas ao longo do campeonato. Aí as razões parecem ser menos questionáveis. E no caso de um ministro?
A mesma arbitrariedade que norteou a demissão do ministro esteve por detrás da nomeação do novo reitor da Universidade Eduardo Mondlane. Um povo trabalhador e determinado, com um país de solos ricos e generosos e que fica a espera de um ministro para não passar fome, é um povo incompetente, podia-se assim pensar.
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